sexta-feira, novembro 27, 2009

Os filhos do Brasil

CÉSAR BENJAMIN
ESPECIAL PARA A FOLHA

A PRISÃO na Polícia do Exército da Vila Militar, em setembro de 1971, era especialmente ruim: eu ficava nu em uma cela tão pequena que só conseguia me recostar no chão de ladrilhos usando a diagonal. A cela era nua também, sem nada, a menos de um buraco no chão que os militares chamavam de "boi"; a única água disponível era a da descarga do "boi". Permanecia em pé durante as noites, em inúteis tentativas de espantar o frio. Comia com as mãos. Tinha 17 anos de idade.

Um dia a equipe de plantão abriu a porta de bom humor. Conduziram-me por dois corredores e colocaram-me em uma cela maior onde estavam três criminosos comuns, Caveirinha, Português e Nelson, incentivados ali mesmo a me usar como bem entendessem. Os três, porém, foram gentis e solidários comigo. Ofereceram-me logo um lençol, com o qual me cobri, passando a usá-lo nos dias seguintes como uma toga troncha de senador romano.

Oriundos de São Paulo, Caveirinha e Português disseram-me que "estavam pedidos" pelo delegado Sérgio Fleury, que provavelmente iria matá-los. Nelson, um mulato escuro, passava o tempo cantando Beatles, fingindo que sabia inglês e pedindo nossa opinião sobre suas caprichadas interpretações. Repetia uma ideia, pensando alto: "O Brasil não dá mais. Aqui só tem gente esperta. Quando sair dessa, vou para o Senegal. Vou ser rei do Senegal".

Voltei para a solitária alguns dias depois. Ainda não sabia que começava então um longo período que me levou ao limite. Vegetei em silêncio, sem contato humano, vendo só quatro paredes -"sobrevivendo a mim mesmo como um fósforo frio", para lembrar Fernando Pessoa- durante três anos e meio, em diferentes quartéis, sem saber o que acontecia fora das celas. Até que, num fim de tarde, abriram a porta e colocaram-me em um camburão. Eu estava sendo transferido para fora da Vila Militar.

A caçamba do carro era dividida ao meio por uma chapa de ferro, de modo que duas pessoas podiam ser conduzidas sem que conseguissem se ver. A vedação, porém, não era completa. Por uma fresta de alguns centímetros, no canto inferior à minha direita, apareceram dedos que, pelo tato, percebi serem femininos. Fiquei muito perturbado (preso vive de coisas pequenas). Há anos eu não via, muito menos tocava, uma mulher. Fui desembarcado em um dos presídios do complexo penitenciário de Bangu, para presos comuns, e colocado na galeria F, "de alta periculosia", como se dizia por lá. Havia 30 a 40 homens, sem superlotação, e três eram travestis, a Monique, a Neguinha e a Eva. Revivi o pesadelo de sofrer uma curra, mas, mais uma vez, nada ocorreu. Era Carnaval, e a direção do presídio, excepcionalmente, permitira a entrada de uma televisão para que os detentos pudessem assistir ao desfile.

Estavam todos ocupados, torcendo por suas escolas. Pude então, nessa noite, ter uma longa conversa com as lideranças do novo lugar: Sapo Lee, Sabichão, Neguinho Dois, Formigão, Ari dos Macacos (ou Ari Navalhada, por causa de uma imensa cicatriz que trazia no rosto) e Chinês. Quando o dia amanheceu éramos quase amigos, o que não impediu que, durante algum tempo, eu fosse submetido à tradicional série de "provas de fogo", situações armadas para testar a firmeza de cada novato.

Quando fui rebatizado, estava aceito. Passei a ser o Devagar. Aos poucos, aprendi a "língua de congo", o dialeto que os presos usam entre si para não serem entendidos pelos estranhos ao grupo.

Com a entrada de um novo diretor, mais liberal, consegui reativar as salas de aula do presídio para turmas de primeiro e de segundo grau. Além de dezenas de presos, de todas as galerias, guardas penitenciários e até o chefe de segurança se inscreveram para tentar um diploma do supletivo. Era o que eu faria, também: clandestino desde os 14 anos, preso desde os 17, já estava com 22 e não tinha o segundo grau. Tornei-me o professor de todas as matérias, mas faria as provas junto com eles.

Passei assim a maior parte dos quase dois anos que fiquei em Bangu. Nos intervalos das aulas, traduzia livros para mim mesmo, para aprender línguas, e escrevia petições para advogados dos presos ou cartas de amor que eles enviavam para namoradas reais, supostas ou apenas desejadas, algumas das quais presas no Talavera Bruce, ali ao lado. Quanto mais melosas, melhor.

Como não havia sido levado a julgamento, por causa da menoridade na época da prisão, não cumpria nenhuma pena específica. Por isso era mantido nesse confinamento semiclandestino, segregado dos demais presos políticos. Ignorava quanto tempo ainda permaneceria nessa situação.

Lembro-me com emoção -toda essa trajetória me emociona, a ponto de eu nunca tê-la compartilhado- do dia em que circulou a notícia de que eu seria transferido. Recebi dezenas de catataus, de todas as galerias, trazidos pelos próprios guardas. Catatau, em língua de congo, é uma espécie de bilhete de apresentação em que o signatário afiança a seus conhecidos que o portador é "sujeito-homem" e deve ser ajudado nos outros presídios por onde passar.

Alguns presos propuseram-se a organizar uma rebelião, temendo que a transferência fosse parte de um plano contra a minha vida. A essa altura, já haviam compreendido há muito quem eu era e o que era uma ditadura.

Eu os tranquilizei: na Frei Caneca, para onde iria, estavam os meus antigos companheiros de militância, que reencontraria tantos anos depois. Descumprindo o regulamento, os guardas permitiram que eu entrasse em todas as galerias para me despedir afetuosamente de alunos e amigos. O Devagar ia embora.


Dias depois de ter retornado para a solitária, ainda na PE da Vila Militar, alguém empurrou por baixo da porta um exemplar do jornal "O Dia". A matéria da primeira página, com direito a manchete principal, anunciava que Caveirinha e Português haviam sido localizados no bairro do Rio Comprido por uma equipe do delegado Fleury e mortos depois de intensa perseguição e tiroteio. Consumara-se o assassinato que eles haviam antevisto. Nelson, que amava os Beatles, não conseguiu ser o rei do Senegal: transferido para o presídio de Água Santa, liderou uma greve de fome contra os espancamentos de presos e perseverou nela até morrer de inanição, cerca de 60 dias depois. Seu pai, guarda penitenciário, servia naquela unidade.

Neguinho Dois também morreu na prisão. Sapo Lee foi transferido para a Ilha Grande; perdi sua pista quando o presídio de lá foi desativado. Chinês foi solto e conseguiu ser contratado por uma empreiteira que o enviaria para trabalhar em uma obra na Arábia, mas a empresa mudou os planos e o mandou para o Alasca. Na última vez que falei com ele, há mais de 20 anos, estava animado com a perspectiva do embarque: "Arábia ou Alasca, Devagar, é tudo as mesmas Alemanhas!" Ele quis ir embora para escapar do destino de seu melhor amigo, o Sabichão, que também havia sido solto, novamente preso e dessa vez assassinado. Não sei o que aconteceu com o Formigão e o Ari Navalhada.

A todos, autênticos filhos do Brasil, tão castigados, presto homenagem, estejam onde estiverem, mortos ou vivos, pela maneira como trataram um jovem branco de classe média, na casa dos 20 anos, que lhes esteve ao alcance das mãos. Eu nunca soube quem é o "menino do MEP". Suponho que esteja vivo, pois a organização era formada por gente com o meu perfil. Nossa sobrevida, em geral, é bem maior do que a dos pobres e pretos.

O homem que me disse que o atacou é hoje presidente da República. É conciliador e, dizem, faz um bom governo. Ganhou projeção internacional. Afastei-me dele depois daquela conversa na produtora de televisão, mas desejo-lhe sorte, pelo bem do nosso país. Espero que tenha melhorado com o passar dos anos. Mesmo assim, não pretendo assistir a "O Filho do Brasil", que exala o mau cheiro das mistificações. Li nos jornais que o filme mostra cenas dos 30 dias em que Lula esteve detido e lembrei das passagens que registrei neste texto, que está além da política. Não pretende acusar, rotular ou julgar, mas refletir sobre a complexidade da condição humana, justamente o que um filme assim, a serviço do culto à personalidade, tenta esconder.

CÉSAR BENJAMIN, 55, militou no movimento estudantil secundarista em 1968 e passou para a clandestinidade depois da decretação do Ato Institucional nº 5, em 13 de dezembro desse ano, juntando-se à resistência armada ao regime militar. Foi preso em meados de 1971, com 17 anos, e expulso do país no final de 1976. Retornou em 1978. Ajudou a fundar o PT, do qual se desfiliou em 1995. Em 2006 foi candidato a vice-presidente na chapa liderada pela senadora Heloísa Helena, do PSOL, do qual também se desfiliou. Trabalhou na Fundação Getulio Vargas, na Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, na Prefeitura do Rio de Janeiro e na Editora Nova Fronteira. É editor da Editora Contraponto e colunista da Folha.

quarta-feira, novembro 25, 2009

Os guerrilheiros da história

ELIO GASPARI

Talvez eles tenham sido 50 e só três sobreviveram,
mas preservaram a memória do Gueto de Varsóvia

ESTÁ CHEGANDO às livrarias "Quem Escreverá Nossa História? - Emanuel Ringelblum, o Gueto de Varsóvia e o Arquivo Oyneg Shabes", do professor Samuel Kassow. É um livro excepcional, que conta um emocionante episódio de heroísmo.

Emanuel Ringelblum tinha 39 anos, mulher e filho, quando a Alemanha invadiu a Polônia. Professor de história e militante da esquerda sionista, recusou-se a sair da cidade. Em outubro de 1941 foi para o gueto, onde os alemães confinaram 400 mil judeus (um terço da população da cidade) numa área murada de 2,5 km2 (o Leblon tem 2,3 km2). Lá o professor formou a Oyneg Shabes (Alegria do Sábado), uma organização clandestina que teve entre 50 e 60 militantes. Juntou empresários, poetas, economistas, professores e, a certa altura, até crianças. Seu objetivo era preservar a memória do que acontecia no gueto. Aquilo que ninguém imaginara não podia ser esquecido.

Durante dois anos os guerrilheiros da história fizeram uma centena de entrevistas, acumularam manuscritos e pesquisaram metodicamente o cotidiano do gueto. (Em janeiro de 1943 a Oyneg Shabes fez chegar a Londres um depoimento detalhado do início do extermínio dos judeus nos campos de concentração.)

Milhares de páginas, objetos e fotografias foram enterrados em pelo menos três lugares. Terminada a guerra, a organização tinha três sobreviventes. Em 1946, um deles achou o primeiro esconderijo, recuperando dez caixas de documentos. Quatro anos depois desenterraram dois latões de leite, repletos de papéis. O terceiro lote ainda não foi achado.

O Gueto de Varsóvia revoltou-se e foi arrasado. Ringelblum e sua família esconderam-se num porão da vizinhança até março de 1944, quando foram descobertos. Na prisão, o professor soube seria possível resgatá-lo da cadeia. Machucado pelas sessões de tortura, ele tinha o filho Uri no colo quando perguntou o que poderiam fazer pelo menino e pela mulher. Nada, disseram-lhe. "Morrer é difícil?", perguntou. Os três foram fuzilados em algum lugar das ruínas do que fora o gueto.

A grandeza do livro do professor Kassow está na apresentação seca e metódica de uma história que tem tudo para deslizar na direção dos sucessos de bilheteria. Sua narrativa chega a ser chata quando descreve as tendências da esquerda judaica na Polônia.

Quando o leitor entra no gueto, percebe que Kassow lhe impôs o seu ritmo, calibrou-lhe a curiosidade. Ele é levado ao cotidiano do gueto pelo historiador, não é o gueto que vem a ele como mais uma história da Segunda Guerra. Não há alemão bonzinho como n'O Pianista, nem a sensualidade da camiseta molhada de uma prisioneira da "Lista de Schindler". Fome, medo, malvadeza e miséria aparecem sem que Kassow levante a voz. A naturalidade com que os alemães matavam. A violência da polícia judaica e o terror imposto pelas suas incursões sanitárias, raspando a cabeça das mulheres e varejando suas casas.

Os guerrilheiros de Ringelblum registraram as oscilações dos preços e salários, redigiram ensaios sobre a economia do gueto e cumpriram os projetos da pesquisa como se estivessem numa centenária universidade europeia. Ringelblum e seus guerrilheiros documentavam o Holocausto no seu aspecto mais terrível, o monótono cotidiano da fome e da humilhação.

sábado, novembro 21, 2009

Economista revela segredos sobre os altos preços da arte

EL PAIS

Isabel Lafont
Em Madri

Como um tubarão dissecado, suspenso em um tanque de formol, pode chegar a valer US$ 12 milhões [€ 8 milhões]? Que mecanismos regem a oferta e a demanda no mercado de arte? O economista americano Donald N. Thompson acompanhou durante um ano os meandros do mercado de arte contemporânea e passou muitas horas entre galeristas, casas de leilões, artistas e colecionadores. O resultado de sua pesquisa é o livro "El Tiburón de 12 Millones de Dólares" [O tubarão de US$ 12 milhões], que é lançado agora na Espanha, e cujo subtítulo, "A curiosa economia da arte contemporânea e dos leilões", já antecipa ao leitor que certamente não encontrará ali as leis clássicas do mercado.

O famoso tubarão-tigre de Damien Hirst, obra intitulada "A Impossibilidade Física da Morte na Mente de Alguém Vivo", que o colecionador Charles Saatchi vendeu ao financista americano Steve Cohen em 2005 pela cifra citada (Saatchi o havia adquirido em 1992 por 50 mil libras, ou cerca de € 56 mil) através do galerista Larry Gagosian, é a alegoria perfeita que serve para Thompson mergulhar na antiga distinção entre valor e preço.

"Como economista e colecionador de arte contemporânea, faz tempo que me sinto perplexo pela questão do que torna uma obra de arte valiosa e por meio de que alquimia se considera que vale US$ 12 ou US$ 100 milhões, em vez de, por exemplo, US$ 250 mil", declara no início do livro.

Segundo Thompson, assim como a Coca-Cola ou a Nike, há artistas, galeristas e casas de leilões que adquiriram um valor como marcas. "Um Mercedes oferece segurança e prestígio. Prada oferece a segurança da elegância e moda atual. A arte de marca funciona do mesmo modo. Os amigos não poderão acreditar quando você disser: 'Paguei 5,6 milhões por esta estátua de cerâmica'. Mas ninguém demonstra desdém quando se diz: 'Comprei na Sotheby's', 'Encontrei na Gagosian', ou 'Este é meu novo Jeff Koons'."

Sotheby's e Christie's entre as casas de leilões; MoMA, Guggenheim ou Tate entre os museus - "uma obra que tenha sido exposta em alguma ocasião no MoMA ou que tenha feito parte de uma coleção do mesmo exige um preço superior devido a sua procedência"; Gagosian ou Jay Joplin, fundador da londrina White Cube entre os galeristas; e artistas como os citados Hirst, Koons ou Andy Warhol são, segundo a tese de Thompson, engrenagens de um maquinário que, "com um marketing bem dirigido e uma marca de sucesso", gera preços inexplicáveis pela lógica para tubarões dissecados ou bolas de basquete em um aquário (no caso de Jeff Koons).

Por trás disso há fatores psicológicos e sociais. Muitos compradores de arte contemporânea nem sempre são especialistas ou entendidos. Simplesmente são muito ricos (em muitos casos novos ricos, como os milionários russos e chineses surgidos nos últimos anos), afirma o economista, e precisam ter a segurança de que estão fazendo uma boa compra. Por isso confiam nas marcas conhecidas.

Ao público que frequenta essa feira das vaidades é dirigido o peculiar mote dos galeristas segundo o qual "vanguardista significa radical, desafiador significa que não se deve tentar compreendê-lo e qualidade de museu significa que, se você precisa perguntar, é porque não pode pagar".

O galerista de marca não é um fenômeno novo. Joplin foi para Hirst o que Ambroise Vollard foi em Paris para Picasso, Cézanne e Gauguin ou, em meados do século 20, Leo Castelli em Nova York foi para Jasper Johns, Robert Rauschenberg ou Cy Twombly. A relação entre um galerista de marca e seus clientes costuma alcançar um grau de confiança cega: "Os colecionadores confiam em seu marchand do mesmo modo que confiam em seu assessor de investimentos. É a ideia de comprar arte mais com os ouvidos do que com os olhos, de comprar o esperado valor futuro do artista", salienta o economista.

Há mais palavras que soam como música aos ouvidos dos clientes das galerias ou casas de leilões, como "Está na coleção de Saatchi" ou "Saatchi quer essa peça". Se uma obra de arte agrada a um dos colecionadores mais conhecidos do mundo, como um VIP que se preze não vai querê-la em sua casa? Não importa que respeitabilíssimos críticos de arte como Robert Hughes qualifiquem a obra de Hirst uma "mercadoria absurda e vulgar" ou que afirmem que Koons "provavelmente não seria capaz de escrever suas iniciais em uma árvore". Afinal, como indicou a Thompson Brett Gorvy, diretor do departamento de arte contemporânea da Christie's, "isto é um negócio, e não história da arte".

quinta-feira, novembro 19, 2009

"A Estrada" é melhor livro da década, segundo jornal inglês "The Times"

da Folha Online

Cormac McCarthy descreve um futuro "não muito distante" do que pensamos quando usamos a expressão. No entanto, a leitura do romance "A Estrada" reporta diretamente ao presente, tanto que a obra foi considerada a melhor da década pela equipe do suplemento de literatura do jornal inglês "The Times". O veículo considera McCarthy um poeta de extremidade, e considera a narrativa do volume simples. Há pausas no sofrimento dos sobreviventes, mas há também mais frequentemente terror. O jornal compara a concisão da linguagem de McCarthy à do escritor norte-americano Ernest Hemingway por meio de cadências que, às vezes, lembram o ritmo pulsante do padre jesuíta e poeta inglês Gerard Manley Hopkins.

Nessa espécie de futuro atemporal descrita em "A Estrada", as cidades foram transformadas em ruínas, as florestas em cinzas, os céus tornaram-se turvos e os mares estéreis. A narrativa é simples e apresenta um homem e um filho que vagam, assim como todos os outros habitantes que restaram na Terra. Cobertores, um carrinho de compras com escassos alimentos e um revólver são seus infiéis companheiros na imensidão. A dupla segue em busca da salvação tanto de si próprios quanto do mundo. Mal sabem que a estrada a seguir também é um caminho a aceitar e digerir a duras penas. A jornada os mantêm unidos e lhes impulsiona a sobreviver.

Seguem abaixo os outros nove títulos que compõem a lista dos dez primeiros melhores livros da década, eleitos pelo "The Times":

2º lugar - "Persépolis" : Autobiografia em quadrinhos de Marjane Satrapi. Após a Revolução Islâmica (1979), a autora --com 10 anos à época-- é obrigada a estudar em uma escola religiosa e a usar véu, sem entender o porquê disto. Ela acompanha as transformações em seu país, assim como os protestos contra a ditadura religiosa que fora implantada. Aos 14 anos, vai morar na Europa e luta para não perder sua identidade. Após quatro anos, volta ao Irã e percebe que está ocidentalizada demais para ser aceita pelo seu antigo grupo.

3º lugar - "A Origem dos Meus Sonhos" : O presidente norte-americano Barack Obama revela detalhes de sua vida pessoal --do adolescente revoltado à grande aposta de renovação dos Estados Unidos. A obra desnuda o modo como Obama vê e encara o mundo.

4º lugar - "Masterworks of the Classical Haida Mythtellers", de Robert Bringhurst: O mundo de Haida consiste em um arquipélago mítico localizado nas costas da Columbia britânica e no Alaska. O autor trabalhou anos com os manuscritos dos Haida e os traduziu para a língua inglesa. "A Story as Sharp as a Knife" aborda um tempo de paixão e uma variedade de riquezas humanas, científicas e poéticas ignoradas por um longo período pela humanidade.

5º lugar - "Suíte Francesa" : A ucraniana Irène Némirovsky começou a escrever a obra em 1941, refugiada num povoado francês. O livro retrata a França vencida e ocupada pelos alemães. Irène transforma em ficção, fatos que provavelmente presenciara, como a debandada dos parisienses às vésperas da invasão nazista e o drama de uma mulher cujo filho é prisioneiro dos alemães.

6º lugar - "O Ponto da Virada" : Com mais de 5 milhões de exemplares em todo o mundo, o livro está há mais de 200 semanas a lista de best-sellers do "The New York Times". Malcolm Gladwell explica o momento em que pequenas mudanças entram em ebulição, fazendo com que a trajetória de uma tendência ou de um comportamento, dê uma guinada e se alastre. Ou se acabe. Eles apresenta ao leitor os experts --indivíduos que atuam como "bancos de dados", fornecendo a mensagem--, os comunicadores ou "cola social" --aqueles que espalham a informação--, e os vendedores --pessoas capazes de nos convencer quando não acreditamos no que estamos ouvindo.

7º lugar - "A Vida de Pi" : Vencedor do "Booker Prize" em 2002, esta obra é uma aventura intrigante e surpreendente. Yann Martel relata a luta de cinco mamíferos --o garoto Pi, uma zebra, uma hiena, um orangotango e um tigre de Bengala--, no meio do Oceano Pacífico, para sobreviver.

8º lugar - "Payback" : Com este livro, Margaret Atwood traça a história cultural da dívida, desde as eras pré-letradas até a atualidade. A autora mostra que a ideia do que devemos uns aos outros se constrói na nossa imaginação e é uma das metáforas mais dinâmicas. Em 2008, Margaret ganou o Prêmio Príncipe das Astúrias de Letras pelo conjunto de sua obra.

9º lugar - Reparação" : Ian McEwan nos apresenta a vida da adolescente Briony Tallis, que vê uma cena estarrecedora: sua irmã mais velha, sob o olhar do filho da empregada, tira a roupa e mergulha, apenas de calcinha e sutiã, na fonte do quintal da casa de campo. Com esse episódio em mente e uma sucessão de equívocos acontecendo, a menina constrói uma história fantasiosa sobre uma cena que presencia. O drama psicológico que tem como pano de fundo a Segunda Guerra Mundial. A obra foi transformada no filme "Desejo e Reparação" pelo diretor Joe Wright.

"O Código da Vinci" : Na contramão dos gostos e desgostos do "The Times", este livro de Dan Brown ocupa a décima posição entre os melhores e a primeira entre os os piores livros da década. Com mais de 70 milhões de exemplares vendidos pelo mundo, o volume trata de um assassinato dentro do Museu do Louvre, em Paris. Pistas ocultas e símbolos sacros permeiam e dão o tom misterioso ao exemplar.

Saiba quais dos melhores livros da década possuem edição em português

da Livraria da Folha

O diário britâncio "The Times" escolheu os cem melhores livros da década. Alguns ainda não possuem edição em português, mas a Livraria da Folha selecionou os que podem ser comercializados no país. Veja a seguir:

"A Estrada" é o melhor livro da década; veja os dez primeiros

11. "Guerra e Paz", de Liev Tolstói
Publicado originalmente em 1869, este grande clássico da literatura escrito por Liev Tolstói narra invasão (e a retirada) francesa comandada pelo imperador Napoleão à Rússia no início do século 19.

12. "Uma Comovente Obra de Espantoso Talento", de Dave Eggers
Narra os acontecimentos trágicos que tomam conta da vida de Eggers quando ele tem apenas 22 anos. Os pais morrem, ele é obrigado a amadurecer e sai em busca de uma vida nova viajando pelos EUA.

13. "Austerlitz", de Winfried Georg Sebald
O professor de história da arquitetura Jacques Austerlitz explora a estação ferroviária de Liverpool Street, em Londres, coletando material para pesquisas, quando é tomado por uma visão que talvez o ajude a explicar não a arquitetura da era capitalista, mas o sentimento incômodo de ter vivido uma vida alheia.

14. "Lendo Lolita em Teerã", de Azar Nafisi
Esta brilhante história é um retrato fascinante do Irã na época mais acirrada do sangrento conflito com o vizinho Iraque. A partir do sutil olhar feminino, aprendemos como era a vida e a luta das mulheres no Irã revolucionário nesta obra de grande paixão e beleza poética, escrita de maneira surpreendentemente original.

15. "Deus, um Delírio", de Richard Dawkins
Eleito um dos três intelectuais mais importantes do mundo, Richard Dawkins contesta a irracionalidade da fé e mostra como a religião alimenta a guerra, fomenta o fanatismo e doutrina as crianças.

17. "Harry Potter e as Relíquias da Morte", de J. K. Rowling
Na sétima parte da série, Harry Potter é incumbido pelo professor de transfiguração de uma tarefa funesta e aparentemente impossível: localizar e destruir os Horcruxes de Voldemort ainda existentes.

19. "As Correções", de Jonathan Franzen
Jonathan Franzen, uma das revelações da literatura americana, conta uma saga contemporânea tragicômica que vai de Nova York à Lituânia, e expõe dramas pessoais, crises conjugais e os conflitos que separam duas gerações de uma típica família dos EUA nos anos 1990. Sucesso de público e crítica, o romance recebeu o National Book Award 2001.

20. "Dentes Brancos", de Zadie Smith
Livro de estreia de Zadie Smith narra a história de dois amigos que se conheceram durante a Segunda Guerra Mundial. O final da guerra os separa, mas eles vão se encontrar em Londres 30 anos depois.

21. "Complô Contra a América", de Philip Roth
Philip é de uma família judia que vive nos Estados Unidos. Seu pesadelo começa durante o suposto tempo em que Charles Lindbergh foi presidente americano, um defensor ardoroso da Alemanha nazista.

22. "A Luneta Âmbar", de Philip Pullman
A obra fecha a trilogia do autor. Lyra desaparece e, em seu encalço, estão: Will, que quer ajudar a amiga; a Igreja, que a considera a nova Eva e, por isso, tenta eliminá-la antes que a menina repita o pecado original; e Lorde Asriel, comandante de um exército de anjos, humanos e pequenos seres alados que, ciente do poder revolucionário de Lyra, a quer ao seu lado.

24. "Não me Abandone Jamais", de Kazuo Ishiguro
Kathy H. tem 31 anos e está prestes a encerrar sua carreira de "cuidadora". Enquanto isso, ela relembra o tempo que passou em Hailsham, um internato inglês que dá grande ênfase às atividades. No entanto esse internato idílico esconde uma terrível verdade: todos os "alunos" de Hailsham são clones, produzidos com a única finalidade de servir de peças de reposição. Pela voz ingênua e contida de Kathy, somos conduzidos até o terreno pantanoso da solidão e da desilusão onde, vez por outra, nos sentimos prestes a atolar.

25. "O Estranho Caso do Cachorro Morto", de Mark Haddon
Este livro é original e envolvente. Na história de mistério e descobertas, Haddon convida o leitor a embarcar ao lado de Christopher em uma emocionante viagem que vai virar o mundo do jovem de cabeça pra baixo.

28. "O Resto É Ruído", de Alex Ross
Crítico musical explica o fenômeno da música clássica contemporânea, através do contexto histórico, social e biográfico. Além de compositores, cita eventos que influenciaram a música no século 20.

29. "Por Acaso", de Ali Smith
Tudo parece transcorrer na mais absoluta normalidade nas férias da família Smart. Mas a tranquilidade familiar logo é abalada pela súbita presença de uma estranha: surgida do nada, Amber se imiscui na intimidade da família e começa a ganhar a confiança e a afeição de todos. Encantados, os Smart passam a lhe revelar o que não dizem nem mesmo entre (e para) si. Em pouco tempo, estarão enredados na intricada psicologia de seus mundos e conflitos interiores.

30. "O Caçador de Pipas", de Khaled Hosseini
Best-seller mundial, este romance de Khaled Hosseini conta a história da amizade de Amir e Hassan, dois meninos quase da mesma idade, que vivem vidas muito diferentes no Afeganistão da década de 1970.

32. "Tudo se Ilumina", de Jonathan Safran Foer
Um jovem escritor judeu vai para a Ucrânia em busca de uma misteriosa mulher que ajudou seu avô a escapar dos nazistas. A viagem real de Jonathan Safran Foer o inspirou a criar esta obra, misturando realidade e ficção numa trama em que conta a história de sua família desde o século 18, de forma divertida e também melancólica.

33. "Crônicas (Vol. 1)", de Bob Dylan
Inicia trilogia autobiográfica do ícone da música. Em suas recordações, Dylan retrata não somente a carreira, mas também a vida levada em festas noturnas, os amores passageiros e amizades inabaláveis.

34. "Seabiscuit", de Laura Hillenbrand
Após a Grande Depressão, um pequeno cavalo de corrida de pernas tortas virou uma celebridade nos EUA. Em 1938, o campeão Seabiscuit teve mais cobertura na mídia que Roosevelt, Hitler e Mussolini.

38. "O Demônio do Meio-Dia", de Andrew Solomon
Ir ao fundo do poço é uma expressão leve para descrever a experiência de vida do autor Andrew Solomon. Ele desceu mesmo foi às profundezas do inferno para vencer uma das síndromes que mais aflige a humanidade nos dias de hoje: a depressão. Fruto de sua dolorosa, dramática e vitoriosa trajetória durante doença, este livro é intensamente envolvente, sagaz, construtivo e humano.

39. "Fugitiva", de Alice Munro
Os oito contos reunidos em "Fugitiva" apresentam mulheres às voltas com seu passado. Alice Munro consegue captar, seja nos momentos decisivos de uma vida, seja nos episódios cotidianos, as tragédias mais profundas que movem suas personagens. A partir de escolhas erradas, descobertas súbitas e armadilhas da sorte, essas mulheres encaram suas mentiras: as que lhes foram contadas, as que elas contaram aos outros e aquelas com que buscaram enganar a si mesmas.

42. "Fun Home", de Alison Bechdel
Este é um livro de memórias onde a quadrinista Alison Bechdel revisita a sua infância e adolescência, especialmente a descoberta de sua homossexualidade e a difícil relação com seu pai Bruce Bechdel.

44. "Freakonomics", de Steven D. Levitt e Stephen J. Dubner
O economista Steven Levitt e o jornalista Stephen J. Dubner estudam a rotina e os enigmas da vida --da trapaça à criminalidade, dos esportes à família-- com conclusões que desmentem o senso comum.

46. "Middlesex", de Jeffrey Eugenides
Middlesex, segundo romance de Jeffrey Eugenides, é sobre Calliope Stephanides, um hermafrodita que foi criado como menina mas que é, na verdade, homem.

48. "Breve História de Quase Tudo", de Bill Bryson
Uma obra que ensina de uma forma divertida todas as matérias científicas que você achava pedantes no colégio. O livro fuge dos jargões técnicos e mostra como a ciência pode ser empolgante.

49. "O Fantasma", de Robert Harris
Ele sempre sorria para as câmeras à porta de Downing Street. Ao lado do presidente norte-americano, engajou-se ativamente na guerra contra o terror. Seu mandato foi fortemente abalado pela explosão de bombas no metrô de Londres. Ao longo de quase uma década, Adam Lang foi primeiro-ministro britânico. Após o triste e solitário ocaso político, recebe, pelas suas memórias, um dos maiores adiantamentos da história do mercado editorial. Isolado com a esposa e um ghost-writer em uma casa de veraneio, ele começa a dar forma à sua biografia.

50. "Sem Logo: A Tirania das Marcas em um Planeta Vendido", de Naomi Klein
Em 1992, a Nike pagou 20 milhões de dólares a Michael Jordan para estampar o rosto do rei do basquete nas propagandas de seu mais novo tênis. A quantia fica ainda mais impressionante quando se descobre que é muito superior do que a que a empresa pagou a todo o conjunto de 30 mil trabalhadores indonésios que efetivamente fabricaram os calçados.

53. "Irmão Lobo", de Michelle Paver
O primeiro livro da série Crônicas das Trevas Antigas leva o leitor para uma viagem de volta à Idade da Pedra, seis mil anos atrás, onde o jovem Torak conta apenas com a ajuda de um filhote órfão de lobo e com sua habilidade como caçador para sobreviver aos perigos da floresta e derrotar um poderoso inimigo. O livro fala sobre lealdade, amizade e coragem.

55. "A Vida Imperial na Cidade Esmeralda", de Rajiv Chandrasekaran
No meio da zona de guerra de Bagdá ergue-se um enclave fortemente murado e protegido, a Zona Verde, onde se localiza o contingente da administração de ocupação norte-americana no Iraque. É um mundo à parte, com vivendas luxuosas, piscinas, bares, centros comerciais, jipes novos, e todas as comodidades que encontraríamos nos Estados Unidos. Com base em entrevistas que fez com pessoas que ali vivem e recorrendo a documentos confidenciais, o autor elabora uma crítica ácida aos representantes do governo dos EUA no Iraque e à distorção da realidade que os rodeia.

56. "Se Ninguém Falar de Coisas Interessantes", de Jon McGregor
Escrito de maneira diferente, esse livro narra a vida dos moradores de uma rua londrina de forma bastante original: é uma história que se passa em uma rua qualquer, em um dia qualquer, em que coisas comuns parecem acontecer.

60. "Colapso: Como as Sociedades Escolhem o Fracasso ou o Sucesso", de Jared Diamond
Diamond explica como o colapso global pode ser evitado, analisando civilizações do último milênio, e investiga porque umas se extinguiram enquanto outras prosperaram.

61. "A Linha da Beleza", de Alan Hollinghurst
Um retrato da juventude yuppie dos anos 80 num dos templos de sua consagração, a Inglaterra de Margaret Thatcher, a Dama de Ferro do neoliberalismo. Esse é o pano de fundo do romance que consagrou o romancista britânico Alan Hollinghurst com o Booker Prize de 2004, englobando todos os países da Comunidade Britânica e a Irlanda. A trama se desenvolve em 1983 ao redor de Nick Guest, um jovem de 20 anos, recém-saído da Universidade de Oxford e fazendo doutorado em letras.

62. "Na Ponta dos Dedos", de Sarah Waters
Escritora inglesa mistura neste romance vitoriano ladrões e golpistas, mansões e manicômios, intriga e desilusão, erotismo e farsa, além de toques contemporâneos, muito suspense e diálogos afiados.

63. "Tábula Rasa", de Steven Pinker
A partir de conhecimentos da ciência da linguagem, da psicologia e da genética, o renomado cientista Steven Pinker questiona o dogma de que o ser humano é tábula rasa ao nascer, e defende a conjugação das influências sociais e da biologia para a compreensão da personalidade e do comportamento.

65. "Nas Peles da Cebola", de Gunter Grass
Em agosto de 2006, o vencedor do Prêmio Nobel de 1999, Günter Grass, revelou em seu livro de memórias que fez parte da tropa de elite nazista, durante a II Guerra Mundial. A declaração provocou reações em todo mundo.

69. "Meu Nome É Vermelho", de Orhan Pamuk
Construído por 19 vozes narrativas, o romance combina trama policial a um panorama histórico e cultural da Turquia, país dividido entre Oriente e Ocidente. Pamuk tem livros traduzidos em mais de vinte línguas.

72. "A História do Bando de Kelly", de Peter Carey
Carey incorpora a identidade de um homem visto tanto como herói nacional quanto criminoso comum --toda criança australiana cresce ouvindo as aventuras de Kelly e seus camaradas. Num país famoso por ter começado sua história como uma colônia penal inglesa, Kelly substitui facilmente histórias de princesas e sapos. Carey acompanha a vida de Kelly desde seu nascimento até a sua morte, com apenas 26 anos.

79. "Jimmy Corgan, o Garoto Mais Esperto do Mundo", de Chris Ware.
Saga familiar de quatro gerações, um retrato amargo da timidez e as relações claustrofóbicas entre parentes são o centro deste livro, uma das mais importantes graphic novels já publicadas do gênero.

80. "O Tigre Branco", de Aravind Adiga
Livro do romancista Aravind Adiga, abre uma larga porta na Índia e revela ao leitor um país dividido por castas, miséria, corrupção e onde o milagre econômico alcançou apenas uma pequena minoria.

81. "Os Filhos do Imperador", de Claire Messud
Marina, Danielle e Julius se conhecem na universidade e se tornam amigos. Todos têm algo em comum; estão certos de que em muito pouco tempo estarão fazendo algo extremamente importante para o mundo. Porém, quando chegam perto dos 30, as coisas não estão do jeito que devem estar.

84. "Bondade", de Carol Shields
Casada há 26 anos com um médico bem-sucedido e mãe de três filhas crescidas, Reta Winters possui motivos que ultrapassam o seio familiar para ser considerada uma pessoa feliz. Tudo parece perfeito até que, na primavera de seus 44 anos, em Ontário, onde reside, sua filha mais velha, Norah, toma a decisão repentina de sair de casa para pedir esmolas numa esquina de Toronto, com uma placa pendurada no pescoço com a palavra "bondade" escrita à mão.

88. "Pureza Fatal", de Ruth Scurr
Robespierre ganha uma impressionante e esclarecedora biografia, que ajuda a compreender uma das mais importantes mudanças para a França e para o mundo, a Revolução Francesa, ocorrida em 1789.

89. "A Feiticeira de Florença", de Salman Rushdie
Mesclando habilmente realidade e ficção, "A Feiticeira de Florença" aproxima a cidade de Machiavelli de um império oriental que atinge, também no século 16, apogeu nas artes e no pensamento filosófico.

90. "Crepúsculo", de Stephenie Meyer
No primeiro livro da série de Stephenie Meyer conta a história de Bella, uma garota que se muda para uma cidadezinha e acaba se apaixonando por Edward Cullen, um garoto lindo, misterioso...e vampiro!

93. "A Ascensão do Dinheiro", de Niall Ferguson
Neste ensaio, o autor Niall Ferguson examina a história financeira do mundo e defende o desenvolvimento da moeda e do sistema bancário como um dos sintomas do processo civilizatório da humanidade.

96. "O Vulto das Torres", de Lawrence Wright
Quando achávamos que o fim da Guerra Fria marcava o fim da história e a humanidade enfim viveria em paz, o atentado terrorista de 11/9 mergulhava o mundo em perplexidade. De repente, tomamos conhecimento de entidades e personagens até então desconhecidos --a Al-Qaeda, Osama bin Laden, os campos de treinamento de terroristas no Afeganistão. Mas o que é a Al-Qaeda? Como surgiu? Aonde pretende chegar? Qual é sua ideologia? Qual o papel dos serviços de inteligência americanos no caso? São estas perguntas que Lawrence Wright, através de um trabalho de jornalismo investigativo, procura esclarecer neste livro.

97. "A Fantástica Vida Breve de Oscar Woo", de Junot Diaz
Vencedor do Pulitzer 2008, Junot Díaz narra em seu romance de estréia a vida nada fácil de Oscar, um nerd dócil e obeso, de origem dominicana, que vive com a mãe e a irmã em um gueto em Nova Jersey.

98. "Meio Sol Amarelo", de Chimamanda Ngozi Adichie
Jovem escritora nigeriana revela o horror da guerra de Biafra, em um romance de proporções épicas, que nunca perde de vista a matéria humana da qual deriva. Livro vencedor do National Book Critics Circle Award e do Orange Prize de ficção 2007.

quarta-feira, novembro 18, 2009

Trecho de "Caim", de José Saramago

Não é usual, posto que este Blog vai virar um diário mesmo a partir do ano que vem.
Mas acredito que cabe aqui uma verdade proverbial, anotada pelo ateu José Saramago em seu ótimo romance:

"A história dos homens é a história dos seus desentendimentos com deus, nem ele nos entende a nós, nem nós o entendemos a ele".

Concordemos ou não, aí está.

segunda-feira, novembro 16, 2009

Clarice Lispector, o sol escuro do Brasil

THE NEW YORK TIMES
Tomás Eloy Martinez

Há pouco mais de meio século, a força de transformação da literatura da América Latina assombrava os países centrais, que haviam alcançado a modernidade graças ao desenvolvimento de suas indústrias, suas descobertas tecnológicas, suas redes de comunicação, seus trens e aviões. Mas sua linguagem e sua capacidade de narrar a sociedade estavam apergaminhadas, cansadas, e supriam a falta de ideias e sangue novos com jogos teóricos que não levavam a lugar nenhum. Na América Latina, o afã de criar esse mundo novo expresso pela revolução cubana parece ter se concentrado na literatura.

Enquanto os países do Rio da Prata, México e Colômbia respiravam a plenos pulmões os novos ares, o gigante Brasil mantinha-se impermeável a tudo o que não vinha de si mesmo. O Brasil mudava de pele, mas se alimentava de sua própria música e de sua própria herança literária. Certa vez perguntaram a João Gilberto por que ele fazia tão poucos shows no estrangeiro, onde sua música tinha um sucesso clamoroso.

"Para quê?", respondeu. "No Brasil meu público é tão numeroso como no resto do mundo e, além disso, ele me escuta com mais felicidade".

Em meados do século 20, o grande nome da literatura brasileira continuava sendo o de Joaquim Maria Machado de Assis (1839-1908), que escreveu uma sucessão de obras mestras mediante o simples recurso de observar atentamente a paisagem interior dos pensamentos e dos sentimentos para contá-los de uma maneira incomum, inesperada. Um de seus maiores herdeiros é João Guimarães Rosa, que impressiona mais do que tudo por seu virtuosismo verbal e pelo ouvido finíssimo com que capta a música das vozes do sertão, no nordeste profundo de seu gigantesco país.

Entretanto, a única filha direta e legítima de Machado de Assis é Clarice Lispector, cuja obra misteriosa começa a difundir-se nos Estados Unidos com tanto ímpeto quanto a de Roberto Bolaño. O chileno foi consagrado pela revista The New Yorker, e o influente The New York Review of Books rendeu tributo a Lispector com um ensaio extenso de Lorrie Moore, a jovem deusa do minimalismo.

Moore adverte que a fama magnética de Lispector se deve em parte aos estudos sobre sua obra reunidos por Hélène Cixous, a quem as universidades francesas devem o apogeu dos estudos sobre a mulher. Na França, recorda Cixous, a extraordinária abstração da prosa de Lispector fez com que a vissem como uma filósofa. Quando ela assistiu a um encontro de teóricos sobre sua obra, abandonou a sala na metade da homenagem, dizendo que não entendia uma só palavra do jargão.

Uma das primeiras vezes que se ouviu falar de Lispector em Buenos Aires foi no final dos anos 70, quando circulou a lenda de que ela havia se queimado viva em sua casa no Rio de Janeiro.

Em 1969 o mítico editor argentino Paco Porrúa havia publicado na editora Sudamericana alguns de seus livros: os romances "A Maçã no Escuro", "A Paixão Segundo G.H." e "Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres", assim como os admiráveis contos de "Laços de Família". Lispector rompia com todas as convenções da arte de narrar e arrancava de cada palavra um tremor secreto, enigmático. Suas revelações eram como as de um teólogo oriental participando de uma dança ritual africana.

Quando a lemos, deslumbrados, na revista "Primera Plana", pensamos que era imperativo viajar para o Rio de Janeiro para decifrar seus segredos. Sara Porrúa, que na época era mulher de Paco, quis ser a primeira nessa busca.

As primeiras notícias que enviou dissipavam a fábula de que Lispector fora queimada viva. Sua cama havia se incendiado acidentalmente quando dormiu com um cigarro aceso. Mas a haviam resgatado a tempo. Sua estranha beleza tártara (os olhos amendoados e rasgados, as maçãs do rosto salientes, a constante expressão de angústia de seu rosto) havia desaparecido quando queimou o lado direito do corpo, imobilizando-lhe o braço. Nada, entretanto, apagava sua paixão por narrar o mundo.

Sara a encontrou mais algumas vezes e, com sua imagem intensa, inesquecível, perdeu-se nas selvas da Guatemala e transformou-se em personagem de Cortázar.

Dar uma ideia de sua imaginação só é possível através de algumas citações. O começo do romance "Uma Aprendizagem..." (1969) é uma frase que vem do nada. A porta de entrada desse livro é uma vírgula: ", estando tão ocupada, viera das compras de casa que a empregada fizera às pressas porque cada vez mais matava o serviço, embora só viesse para deixar almoço e jantar prontos...".

Antes desse comentário doméstico e trivial, Lispector surpreendeu o leitor com uma advertência que é também uma afirmação de seu ser:

"Este livro se pediu uma liberdade maior que tive medo de dar. Ele está muito acima de mim. Humildemente tentei escrevê-lo. Eu sou mais forte que eu. C.L."

E no final de "Água Viva", ergue a voz: "Não vou morrer, ouviu, Deus? Não tenho coragem, ouviu? Não me mate, ouviu? Porque é uma infâmia nascer para morrer não se sabe quando nem onde. Vou ficar muito alegre, ouviu? Como resposta, como insulto".

Seu desmedido desafio à morte impregna muitas das crônicas reunidas em "Revelación del Mundo", que incluem todas as que escreveu para o Jornal do Brasil entre 1967 e 1973. Outras, inéditas, serão publicadas no ano que vem em espanhol sob o título de "Descubrimientos".

Lispector continua sendo um enigma velado que assombra em cada frase, em cada desvio da vida. Morreu aos 57 anos de um câncer nos ovários, depois de ter passado os últimos anos fechada na solidão de sua casa do Leme, perto das areias de Copacabana.

Seu autorretrato cabe em uma frase: "Olhar-se ao espelho e dizer-se deslumbrada: Como sou misteriosa".

Tradução: Eloise De Vylder

Tomás Eloy Martínez
Analista político e escritor, o argentino Tomás Eloy Martínez é autor de livros como "Vôo da Rainha" e "O Cantor de Tango".

sábado, novembro 14, 2009

O livro que Nabokov não queria que você lesse

RAQUEL COZER
DA REPORTAGEM LOCAL

Vera, mulher de Vladimir Nabokov (1899-1977), foi quem salvou "Lolita" quando o autor começou a pôr fogo nos manuscritos no quintal de casa, em 1950. Ele só via defeitos ali. Publicado cinco anos depois, o romance o consagraria. Agora, leitores de vários países terão acesso a "O Original de Laura", outra obra cujo destino seriam as chamas não fosse a interferência de Vera.

Com uma diferença. Nabokov não só não teve tempo de mudar de ideia quanto à qualidade desses últimos rascunhos como não pôde concluí-los, já que morreu antes. Seu derradeiro pedido à mulher foi que ateasse fogo aos papéis caso o romance não fosse finalizado. Sem coragem para queimá-los, Vera os guardou até morrer, em 1991. Dmitri, filho do casal, manteve desde então a dúvida sobre a publicação.

Em 2008, fechou com as editoras Knopf/Random House (EUA) e Penguin (Inglaterra). Dmitri alega que se trata de um romance "brilhante". A primeira crítica, feita em julho pela "Publishers Weekly" a partir de um trecho, foi negativa (leia ao lado) e alimentou os comentários sobre o interesse financeiro na decisão -sabe-se que, aos 75, debilitado, o filho de Nabokov precisa pagar internações e exames caros na Suíça.

O livro terá lançamento depois de amanhã, num evento em Nova York que contará com a presença do escritor inglês Martin Amis e do irlandês Brian Boyd, mais renomado biógrafo de Nabokov. No Brasil, sai no próximo final de semana, editado pela Alfaguara.

Em entrevista à Folha por telefone, da Nova Zelândia, onde vive, Boyd demonstra sentimentos ambíguos em relação ao lançamento. Ele foi consultado por Dmitri ao longo de todo o processo e chegou a ajudá-lo com ideias para a edição, mas ainda lembra a impressão que teve quando, em 1987, tornou-se a primeira pessoa fora da família a ver os rascunhos.

"Não fiquei bem impressionado. Quando Vera e Dmitri me perguntaram o que deveria ser feito dos manuscritos, falei para eles os destruírem. Tive medo... Não tinha gostado dos últimos romances dele e tive medo de que 'Laura' fosse o sinal evidente do declínio", diz. Boyd ressalva que, naquele momento, só conseguiu ler os rascunhos na frente de Vera, "o que pode ter influenciado no mal-estar em relação ao texto".

Biógrafo muda de ideia
O biógrafo -que hoje edita uma coletânea de cartas de Nabokov- diz pensar diferente agora. "Quando reli o material, em 2001, meu conceito melhorou muito. Não é uma história incrível, como "Ada ou Ardor", mas tem malícia, capacidade de envolver, um jeito de fazer as coisas acontecerem mais rápido do que o leitor pode lidar. Num ponto baixo de sua carreira, Nabokov descobre novas formas de narrar."

O "Original de Laura" tem semelhanças com "Lolita" -envolve a relação entre um homem maduro e uma garota. Flora, cuja vida sexual conturbada levou um ex-amante a escrever escandaloso livro ("Laura"), casa-se com um homem bem mais velho, Philip Wild. Ao longo do livro, Nabokov remete à morte de Wild. Os textos foram escritos em 138 cartões, com situações centrais a partir das quais Nabokov desenvolveria a história. O autor já estava com vários problemas de saúde nos meses em que os rascunhou.

Boyd diz que a edição tem a vantagem de deixar claro que não se trata de um trabalho final. A versão em inglês traz reproduções dos cartões que podem ser retiradas e devolvidas ao livro. No Brasil, o livro sairá com os fac-símiles, em inglês, e a tradução ao lado.

sexta-feira, novembro 13, 2009

Após susto, Vasco vira, derrota o América-RN e confirma o título da Série B

Raphael Raposo
No Rio de Janeiro

A festa estava toda pronta no Maracanã, mas o América-RN veio para estragá-la. E até conseguiu ao fazer 1 a 0, ainda no primeiro tempo. Porém, mesmo perdendo pênalti (com Elton), o Vasco virou, fez 2 a 1, e, de forma antecipada, conquistou o título da Série B do Campeonato Brasileiro, na noite desta sexta-feira, pela 36ª rodada da competição. A última conquista do Cruzmaltino tinha sido o Estadual de 2003.

Elton e Alex Teixeira fizeram os gols do Vasco, enquanto Lúcio marcou para o América-RN. Com o triunfo, o time cruzmaltino chegou aos 76 pontos e não pode ser mais alcançado por ninguém. Já a equipe potiguar parou nos 42 e segue sua luta contra o rebaixamento à Série C do Campeonato Brasileiro.

"Parabéns para esta torcida maravilhosa. O nosso grupo também foi brilhante, mesmo com todas as dificuldades ao longo do ano. Só nós sabemos o que passamos para conquistar o título da Série B e o acesso à Série A", disse o técnico Dorival Júnior.

Na próxima rodada, o Vasco, mais uma vez no Maracanã, encara a Portuguesa. Já o América-RN recebe o Ipatinga, no Machadão, em Natal. As duas partidas serão realizadas no sábado, dia 21, às 17h (horário de Brasília).

Na partida contra o América-RN, o Vasco, finalmente, jogou com a camisa comemorativa pelo retorno à elite do futebol nacional. Ela deveria ter sido usada diante do Campinense, na última terça-feira, mas, para não confundir com o uniforme da equipe paraibana, o árbitro do duelo acabou vetando.

Jogando em casa e precisando de uma simples vitória para deixar o Maracanã com o título da Série B, o Vasco começou em cima do América-RN. Porém, com uma marcação forte, o time potiguar minou a equipe cruzmaltina e equilibrou as ações.

Não demorou muito para o América-RN, aos 13 minutos, abrir o placar por intermédio de Lúcio. A desvantagem deixou o Vasco nervoso. A situação piorou com a resposta vinda da arquibancada. Irritada, a torcida passou a vaiar o time, que não se encontrou mais. O primeiro tempo terminou mesmo 1 a 0 para os visitantes.

O Vasco voltou para o segundo tempo com Fumagalli no lugar de Ernani. E, na saída de bola, o meia sofreu pênalti de Leandro, que acabou expulso. Elton, aos três minutos, bateu, mas Rodolpho pegou, evitando o empate cruzmaltino.

Mesmo com o pênalti perdido, o Vasco não "baixou a guarda". O time, aproveitando a vantagem numérica, encurralou o América-RN. O jogo passou a ser de ataque contra defesa. O empate era questão de tempo e ele veio, de pênalti, aos 15 minutos, através de Elton.

A igualdade no placar fez o Vasco acreditar que a virada aconteceria a qualquer momento. Porém, somente aos 40 minutos, com Alex Teixeira, que o Cruzmaltino virou a partida, deu números finais ao confronto e carimbou o título antecipado da Série B do Campeonato Brasileiro.

VASCO 2 x 1 AMÉRICA-RN

Vasco
Fernando Prass; Fagner (Aloísio), Vilson (Philippe Coutinho), Titi e Ramon; Nilton, Souza, Ernani (Famagalli) e Carlos Alberto; Alex Teixeira e Elton.
Técnico: Dorival Júnior

América-RN
Rodolpho; Thoni, Leandro, Edson Rocha e Jackson; Julio Terceiro (Ramirez), Ricardo Oliveira, Somália e Juninho (Wilton Goiano); Lúcio e André Luís (Geovane).
Técnico: Ricardo Dia
Data: 13/11/2009 (sexta-feira) Local: Maracanã, Rio de Janeiro (RJ)
Árbitro: José Henrique de Carvalho (SP) Auxiliares: Marcelo Carvalho Van Gasse (SP) e Nilson de Souza Monção (SP)
Público: 50.237 (pagantes) e 52.985 (presentes) Renda: R$ 746.330,00
Cartões amarelos: Alex Teixeira (Vasco). Leandro, Ricardo Oliveira, Júlio Terceiro e Edson Rocha (América-RN).Cartão vermelho: Leandro, aos 27 segundos do segundo tempo (América-RN).
Gols: Lúcio, aos 13 minutos do primeiro tempo. Elton (pênalti), aos 15 minutos; e Alex Teixeira, aos 40 minutos do segundo tempo.

quinta-feira, novembro 12, 2009

Definidos os grupos do Campeonato Carioca

Vinicius Castro
RIO DE JANEIRO

A Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (Ferj) definiu, nesta quinta-feira, os detalhes do Campeonato Carioca de 2010. A competição terá início em 16 e 17 de janeiro com a mesma fórmula dos últimos anos, sendo dividida em Taça Guanabara e Taça Rio. Os dois melhores do Grupo A e os dois melhores do Grupo B classificam-se para às semifinais.

O sábado de Carnaval e a Quarta-Feira de Cinzas terão jogos das semifinais da Taça Guanabara. Os clássicos também foram definidos. Na terceira rodada do primeiro turno, Botafogo e Vasco se enfrentam, no dia 24 de janeiro. No fim de semana seguinte, Flamengo e Fluminense duelam no Maracanã.

Na Taça Rio, Fluminense e Botafogo se encaram no dia 7 de março, Vasco e Flamengo se enfrentam no dia 14 de março, Botafogo e Flamengo duelam no dia 21 de março, e Vasco e Fluminense jogam no dia 28 de março.

O presidente da Ferj, Rubens Lopes, comentou o sorteio da tabela da competição:

- Tivemos um arbitral muito tranquilo e o critério foi muito bem definido. Ninguém pode reclamar.Trabalhamos com a utilização do Maracanã, mas se houver alguma mudança, o Engenhão vai sediar os clássicos - afirmou.

A novidade fica por conta de uma equipe de engenharia civil colocada à disposição dos clubes pela Ferj. Além dos laudos da Polícia Militar, Corpo de Bombeiros e Vigilância Sanitária, os estádios precisam estar aptos a receber as partidas através de um laudo da engenharia civil. A Ferj também está reformando todos os gramados com o auxílio de engenheiros agrônomos.

Por fim, Rubens Lopes celebrou o Campeonato Carioca:

- Sem dúvida é o melhor campeonato estadual do país - encerrou.

Confira abaixo os grupos e as estreias do quatro grandes (com datas ainda a serem definidas):

GRUPO A
Flamengo
Fluminense
Americano
Bangu
Boavista
Volta Redonda
Duque de Caxias
Segundo colocado da Série B

GRUPO B
Vasco
Botafogo
Macaé
Madureira
Friburguense
Resende
Tigres
Campeão da Série B

Jogos de estreia dos grandes (sem as datas definidas):

Flamengo x Duque de Caxias
Americano x Fluminense
Vasco x Tigres
Macaé x Botafogo

quarta-feira, novembro 11, 2009

Universidades desprezam escritores populares, diz crítica literária premiada

SÉRGIO RIPARDO
Colaboração para a Livraria da Folha

Os estudos acadêmicos costumam desprezar os autores de grandes tiragens. A avaliação é da crítica literária e professora universitária Marisa Lajolo, 65, que ganhou neste ano o prêmio Jabuti, o mais tradicional da literatura brasileira, na categoria "não-ficção".

"Monteiro Lobato: Livro a Livro" foi planejado e organizado pela professora da Unicamp e pelo professor João Luís Ceccantini, da Unesp (Universidade Estadual Paulista).

"O Lobato é uma figura muito popular, mas a academia cuida muito pouco do Lobato. Ninguém se interessa pelos autores que todo mundo lê. As pessoas querem aqueles autores desconhecidos, encafuados, que alguém descobriu que era ótimo", disse Lajolo.

Monte sua biblioteca sobre Lobato

Para a crítica literária, seu livro chamou atenção neste ano por abordar a obra de um escritor famoso.

"A academia falou de um autor que todo mundo conhece e todo mundo leu. Isso deu um temperinho diferente ao livro."

"Monteiro Lobato: Livro a Livro" levou mais de quatro anos para ser organizado, contando com a participação de alunos de pós-gradução da Unicamp e da Unesp.

Os pesquisadores analisaram os originais e as edições dos livros infantis de Monteiro Lobato (1882-1948), bem como ilustrações e até cartas que o autor de "Reinações de Narizinho" recebia dos seus leitores.

Os capítulos dissecam as várias edições das obras de Lobato, trazendo detalhes sobre cada publicação e a respectiva correspondência registrada pelo autor de livros infantis, famosos com a adaptação para a TV, como a série "Sítio do Picapau Amarelo", exibida na Globo desde os anos 70.

Os países em desenvolvimento, principais vítimas do aquecimento climático

LE MONDE

Hervé Kempf

Diversos estudos confirmam que os países pobres serão as principais vítimas da mudança climática, ainda que sejam os menores responsáveis por ela, por não serem grandes emissores de gases de efeito estufa. Um estudo publicado no início de setembro deste ano pela Maplecroft, uma consultoria britânica especializada em riscos globais, mostra que os países mais vulneráveis ao aquecimento são a Somália, o Haiti, o Afeganistão e Serra Leoa. Dos vinte e oito países expostos a um "risco extremo", vinte e dois estão situados na África subsaariana.

Enquanto isso, em Manila, o Banco Asiático de Desenvolvimento apresentava os resultados de uma pesquisa que concluía que o derretimento das geleiras do Himalaia ameaça a segurança alimentar e a disponibilidade de água dos 1,6 bilhão de habitantes do sul da Ásia. Em Nova York, Rob Vos, diretor do departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU, avaliou que "se não reduzirmos as emissões de gases de efeito estufa de forma significativa, os danos causados à economia dos países pobres serão dez vezes maiores do que aqueles registrados nos países desenvolvidos". Vos comentava o relatório publicado por seu departamento. Segundo as conclusões, seria preciso investir todos os anos na atenuação da mudança climática e na adaptação a seus efeitos, da ordem de 1% do produto interno bruto (PIB) mundial, ou seja, US$ 500 bilhões (R$ 855 bilhões).

Alguns meses antes, em maio de 2009, a ONU havia publicado um relatório da Estratégia Internacional de Redução de Riscos, lançado em 2000. O documento faz a primeira síntese dos conhecimentos sobre os desastres naturais que se produziram entre 1975 e 2008. Ainda que reconheça não ser completo, o texto representa um aglomerado único de conhecimentos.

Entre 1975 e 2008, ele lista 8.866 desastres que mataram 2.284.000 pessoas. A respeito das inundações, o risco de morte aumentou 13% entre 1990 e 2007. Pode-se dizer que o quadro não é uniformemente catastrófico. O número absoluto de perdas humanas ou econômicas aumenta no período como um todo, mas ele permanece proporcionalmente estável, pelo aumento demográfico e do PIB mundial.

Mas, segundo os especialistas da ONU, a situação deverá se deteriorar em razão da mudança climática e da degradação dos ecossistemas. Esta é um fator muito ignorado, pois estes últimos conseguem amortecer o impacto das catástrofes de origem natural. Quanto à mudança climática, ela aumentará o risco dos desastres. A vulnerabilidade das populações é um dos outros fatores que acentuam os riscos. A ação do poder público (normas antissísmicas, etc.) torna-se crucial: o Japão e as Filipinas sofrem com mais ou menos o mesmo número de furacões, mas estes provocam 17 vezes mais mortes nas Filipinas do que no Japão.


Tradução: Lana Lim

terça-feira, novembro 10, 2009

Barris de pólvora

Como se sabe, aqui em São Luís nós temos um sério problema com o sistema de transporte coletivo.
Nove entre dez ludovicenses sem dúvida alguma já passaram pela triste experiência de descer de um ônibus que ficou pelo caminho em razão de defeitos mecânicos. Na verdade, deveria ter colocado “dez entre dez”, mas tenho uma até certo ponto perigosa tendência para as concessões.
Querem mais uma situação capaz de tirar qualquer um do sério? Levante a mão quem já passou por isso: um ônibus aproxima-se da parada em que você se encontra e, mesmo não estando lotado, não atende ao gesto tradicional e passa direto. Nesse caso, se alguém tomar para si o trabalho de questionar o motorista, ele muito provavelmente terá apenas uma palavra como resposta-desculpa padrão: horário.
Outra: não se deixem enganar pelo número de coletivos que transitam, por exemplo, pela Praça Deodoro. São dezenas, surgindo um depois do outro - dependendo do horário, a fim de conduzir os ludovicenses (ou aqueles que sem mais o que fazer visitam nossa Ilha) para o trabalho ou de volta para casa depois de mais uma jornada cansativa. As aparências enganam - e revoltam.
Na verdade, o número de ônibus em circulação é muito menor do que se imagina. Até onde sei - e naturalmente espero ser corrigido -, São Luís conta com cerca de 900 anos. Muito pouco para uma cidade com mais de um milhão de habitantes (não importa o que digam o IBGE e Luís Fernando Silva).
Nós, os simples, sofremos na pele com essa quantidade risível de coletivos. Aqueles que, por alguma causa, motivo, razão e circunstância acharam por bem residir na Cidade Operária merecem um lugar especial no paraíso, por terem enfrentado e conseguido sobreviver a provações diárias.
É uma aventura nada auspiciosa. Quem acorda entre cinco e meia e seis horas da manhã levanta da cama sabendo que muito em breve travará dois combates que não lhe trarão glória nenhuma, caso tenha sucesso. O primeiro: conseguir entrar em uma dessas latas de sardinha ambulantes. O segundo: disputar, geralmente com algumas cotoveladas aqui e ali, qualquer espaço que lhe garanta uma viagem com um mínimo de conforto. Mas bem mínimo mesmo, porque as tribulações são muitas. Para deixar em apenas uma: os constantes entreveros entre passageiros, motoristas e cobradores. O que acaba transformando um ônibus em um barril de pólvora.
Mas por trabalhar em um jornal, é preciso que aqui haja o necessário contraditório. Os funcionários das empresas de transporte coletivo não são os culpados pela atual crise no setor (veja só, Érica, aprendi a lição: pesquei um pouco do jargão de economia). Os responsáveis, naturalmente, são seus patrões. Estes homens que, em sua egocêntrica teimosia, não renovam a frota e, confrontados com cobranças nesse sentido, ameaçam com demissões e a possibilidade de aumento nas passagens.
Motoristas e cobradores, no máximo, reagem mal às condições adversas nas quais se encontram. Ou você aceitaria numa boa trocar de lugar com um deles e passar a trabalhar com medo de seqüestros ou assaltos?
Como sou otimista, espero que a situação do transporte coletivo melhore o mais rápido possível. Caso contrário, as cenas lamentáveis ocorridas no Terminal da Cohama na segunda-feira (9) serão cada vez mais comuns. Doa em quem doer.

Sarney procura cineasta para projeto de filme sobre sua trajetória

SÉRGIO RIPARDO
Colaboração para a Livraria da Folha

O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), quer ver sua história nos cinemas, a exemplo do que vai ocorrer no começo de 2010 com a cinebiografia do presidente Lula.

A Livraria da Folha apurou que Sarney convidou o cineasta carioca Silvio Tendler para o projeto. O documentarista já fez produções sobre os ex-presidentes da República João Goulart (1918-1976) e Juscelino Kubitscheck (1956-1961). Atualmente, Tendler filma a história de Tancredo Neves (1910-1985). Foi nas filmagens para esse trabalho sobre Tancredo que surgiu o contato entre o senador e o cineasta.

Já existe um documentário sobre o presidente do Senado, feito por Fernando Barbosa Lima (que morreu no ano passado), mas o resultado desagradou Sarney, segundo a Livraria da Folha apurou.

A ideia é que o filme sobre Sarney seja lançado em 2010, aproveitando que, no próximo dia 24 de abril, o senador completa 80 anos. Ele nasceu em Pinheiro (MA) e foi presidente do Brasil entre 1985 a 1990.

A exemplo de Lula, Sarney quer ter interferência na obra audiovisual. Atualmente, a trajetória do presidente do Senado é alvo de interesse no mercado editorial, onde "Honoráveis Bandidos - Um retrato do Brasil na era Sarney" figura entre os livros mais vendidos no país. Está em quarto lugar na lista divulgada no último sábado pela Folha. Nesta semana, a expectativa é que suba posições, como se observou em levantamentos divulgados nesta terça por outras livrarias.

Na semana passada, o livro foi lançado em São Luís (MA), na sede do Sindicato dos Bancários, com direito a tumulto e pancadaria. O autor Palmério Dória teve de andar acompanhado de uma equipe de seguranças. Sarney já disse que não viu, não leu e não se interessa pela obra, que fala até das intimidades sexuais da família Sarney. Com certeza, "Honoráveis Bandidos - Um retrato do Brasil na era Sarney" não vai inspirar um filme aprovado pelo senador.

segunda-feira, novembro 09, 2009

Autor diminui papel de Reagan e dos Eua na queda do Muro de Berlim

HERALD TRIBUNE

Michael Meyer

Pergunte a um norte-americano médio como terminou a Guerra Fria e é muito provável que ele ou ela terá uma resposta pronta. "Sr. Gorbachev, derrube este muro", disse Ronald Reagan. E então, como se as palavras fossem ações, assim foi.

Todos se lembram dessa frase imortal. Uma geração de escritores de discursos gostaria de tê-la elaborado. Uma geração de estadistas gostaria de tê-la proferido. E para uma geração de norte-americanos, particularmente na direita política, ela se tornou um símbolo de toda uma visão geopolítica do mundo.

Como [o famoso jogador de futebol norte-americano] Gipper, precisamos apenas nos colocar firmemente diante dos tiranos. Ocos em seu íntimo, eles cairão. Seus povos oprimidos se levantarão, triunfantes, como as multidões cativas de europeus do leste de outrora. A democracia florescerá.

Neste 9 de novembro de 1989, faz 20 anos que o muro de Berlim caiu. Não importa que Reagan tenha feito seu discurso épico dois anos antes disso. Durante os próximos dias e semanas, ele será transmitido e retransmitido nas telas de TV norte-americanas, reforçando o mito tão adorado por todos os norte-americanos sobre a Guerra Fria. Nós vencemos!

Vencemos? Bem, sim e não. Certamente, não o fizemos sozinhos. Se você estivesse "in loco" durante o tumultuado ano de 1989, como eu estava quando era correspondente da Newsweek, veria um quadro mais complexo.

A principal força que desencadeou as grandes mudanças veio do Leste, não do Oeste: Mikhail Gorbachev. Repentinamente livres para experimentar, países intermediários encontraram caminhos para um novo futuro. A Polônia realizou eleições - que os comunistas do país perderam, decisivamente. A Hungria rompeu sua Cortina de Ferro, desencadeando um êxodo vindo de toda parte do bloco do Leste. Na antiga República Democrática Alemã, os alemães orientais se encheram de coragem e, às centenas de milhares, tomaram as ruas.

À medida que nos voltamos para esses eventos que abalaram o mundo, deveríamos lembrar que a sorte, a mera coincidência, desempenhou um papel gigantesco. Chame isso de lógica da bagunça humana, cuja Prova A é certamente a "queda" do muro propriamente dita. Ela começou com os alemães orientais impacientes, pedindo liberdade não de uma forma abstrata, mas uma liberdade específica: o direito de viajar. Em face aos protestos em massa, o líder da Alemanha Oriental Egon Krenz decidiu imprudentemente conceder aquilo que ele não tinha mais medo de proibir - e prometeu abrir os portões para o Ocidente.

Poucos se lembram, hoje, que esse direito era estritamente controlado, sujeito a todos os tipos de regras e regulações comunistas - tampouco se lembram que a decisão deveria entrar em vigor em 10 de novembro. Mas o novo porta-voz do Partido Comunista também não se lembrou disso na época. Ao ser questionado, em uma coletiva de imprensa, sobre quando a nova política seria implementada, ele fez uma pausa, mexeu em seus papéis, ajeitou os óculos, depois respondeu com um dar de ombros: "... ab sofort" - imediatamente.

Para Krenz, "imediatamente" significava no dia seguinte. Para o povo da Alemanha Oriental, as palavras queriam dizer "naquele exato momento".

Eu estava do lado oriental do posto de checagem Charlie naquela noite, observando enquanto milhares de pessoas se reuniam; uma multidão involuntária encarava uma fileira de poucos guardas da Volkspolitzei, apontando os dedos para suas armas. "Abram! Abram!", gritavam as pessoas.

Atrás da polícia e de seus cães de guarda, atrás da torre de observação e do arame farpado da infame linha da morte, do outro lado do cinzento Muro de Berlim, vinha uma resposta de uma multidão igualmente ruidosa: "Venham!"

Dentro de seu posto de comando blindado, o capitão da guarda de fronteira da Alemanha Oriental, um homem musculoso, de queixo quadrado e com o ar irritável de um doberman, discou repetidas vezes o telefone. Ligações semelhantes vieram de vários postos de checagem por toda a extensão do Muro. O que está acontecendo? O que devemos fazer?

Mas nenhuma instrução foi dada pelo Ministério de Interior. Por uma última vez, ele colocou seu telefone no gancho. Por um momento, ficou imóvel como uma pedra. Talvez ele tivesse acabado de ser informado de que o cruzamento de Bornholmer Strasse, ao norte, havia aberto suas barreiras momentos antes, tomado por cerca de 20 mil pessoas. Talvez ele tenha chegado à sua própria decisão. Qualquer que seja o caso, às 23h17, precisamente, ele ergueu os ombros, como se dissesse: "Por que não?"

"Alles auf", ordenou. "Abram tudo", e os portões se abriram amplamente. Uma torrente de pessoas passou por eles, como se houvessem destampado o ralo da banheira. Em uma batida de coração o Muro caiu, e com ele o mundo comunista. A história mudou por causa do uso equivocado de uma única palavra, puro acidente humano.

Se há uma lição a ser tirada disso, ela tem a ver com os perigos de construir mitos, em uma tentativa de "gerenciar a história", como afirma Reinhold Neibuhr. Sim, os Estados Unidos ganharam a Guerra Fria com seu Plano Marshall, a doutrina da contenção, a chantagem da destruição nuclear mutuamente garantida.

Mas os norte-americanos não se preocuparam em entender como, exatamente, ela terminou. Em vez de apreciar sua complexidade, para não mencionar o elemento da sorte, nós creditamos a nós mesmos uma vitória inequívoca. Sem estender mais o assunto, pode-se argumentar que nada mudou desde essa história mitologizada até a desventura dos Estados Unidos no Iraque.


Michael Meyer, diretor de comunicações para o secretário geral da Organização das Nações Unidas, é autor de "O Ano que Mudou o Mundo".)

Tradução: Eloise De Vylder

Após "repetição de erros", Simon não apita mais no Campeonato Brasileiro

Do UOL Esporte
Em São Paulo

A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) anunciou na tarde desta segunda-feira que o árbitro Carlos Eugênio Simon está afastado do Campeonato Brasileiro. A suspensão do gaúcho presente no quadro da Fifa vem um dia depois da atuação polêmica na vitória por 1 a 0 do Fluminense sobre o Palmeiras neste domingo, mas acontece em "decorrência" da sucessão de equívocos ao longo do torneio.

Em nota oficial publicada em seu site oficial, a CBF informou que "em virtude da repetição de erros cometidos durante a competição, o árbitro Carlos Eugênio Simon (RS), que apitou o jogo Fluminense x Palmeiras, domingo, no Maracanã, está afastado até o final do Campeonato Brasileiro 2009."

Na partida em questão, Simon invalidou um gol marcado pelo atacante Obina no primeiro tempo, quando a partida estava empatada por 0 a 0. O árbitro gaúcho alegou que o palmeirense cometeu falta no adversário Maicon ao subir para cabecear, mas as imagens televisivas mostraram que o camisa 28 do time alviverde, na verdade, foi puxado pelo jogador do Flu.

Árbitro brasileiro nas Copas do Mundo de 2002 e 2006, Simon também não viu uma cabeçada que o atacante Alan deu no lateral-esquerdo Pablo Armero, que inclusive deixou o campo sangrando com um corte no supercílio, na segunda etapa de jogo. Ademais, o zagueiro alviverde Danilo teria sofrido pênalti após ser derrubado por Gum.

O desempenho de Simon na partida causou ira na diretoria palmeirense. Ainda nos vestiários do Maracanã, o gerente de futebol Toninho Cecílio avaliou a atuação do árbitro como "covarde" e intimou o juiz a prestar esclarecimento pela invalidação do gol de Obina.

Já o presidente Luiz Gonzaga Belluzzo vociferou em carta publicada na manhã desta segunda-feira, dizendo ao Blog do Juca que o gaúcho era um "operador oficial de interesses escusos" e, ao jornal Lance!, que o apitador "é vigarista, safado e crápula".

Outra atuação polêmica de Simon neste Brasileirão se deu no clássico paulista entre São Paulo e Santos, em 25 de outubro, pela 31ª rodada. O mediador do jogo expulsou o goleiro Rogério Ceni por um choque com o atacante santista Jean e foi acusado pelo camisa 1 tricolor de "persegui-lo". Os santistas também se queixaram do pouco tempo de acréscimo dado pelo juiz no segundo tempo.

Apesar da suspensão de âmbito nacional recebida nesta segunda-feira, Carlos Eugênio Simon está escalado para apitar o confronto entre River Plate, do Uruguai, e LDU, do Equador, na quinta-feira, pela ida das semifinais da Copa Sul-Americana.

Também nesta segunda, a CBF informou que o árbitro Nielson Dias, responsável pela partida entre Vasco e Juventude no sábado, está fora do próximo sorteio. O apitador deixou de marcar um toque de mão de Elton no lance do primeiro gol do clube carioca, que retornou à primeira divisão com uma vitória sobre os gaúchos por 2 a 1.

sábado, novembro 07, 2009

"Em 1989, a história desembestou", diz Mikhail Gorbachev

LE MONDE

Entrevista concedida a Daniel Vernet

Aos 78 anos, Mikhail Gorbachev continua a percorrer o mundo por causa de sua fundação, que tem sede em Moscou, na Rússia. Ele também é presidente da World Political Forum, uma organização com base em Turim e mantida por coletividades locais italianas. No ex-presidente soviético há uma mistura de orgulho por ter sido responsável pelas reformas que abalaram a Europa, e de lamentação pelo fim da URSS, que ele teve de ratificar em 25 de dezembro de 1991.

Ele continua certo de que dois objetivos contraditórios - o restabelecimento da soberania dos povos e a preservação da URSS - eram compatíveis. Entretanto ele pensa que, nos tumultos que marcaram o fim da guerra fria, o positivo prevaleceu sobre o negativo.

Le Monde - Quando o senhor pensa no ano de 1989, quais são as imagens, as lembranças, que lhe vêm espontaneamente à cabeça?
Mikhail Gorbachev - Para mim foi o início da realização de meu projeto mais importante, a reforma política. O Congresso de Deputados havia sido eleito no mês de maio sobre novas bases. Era a primeira vez que havia eleições livres na Rússia. Somente esse fato marcava o início da primavera política. Em seguida, tivemos de constituir o Parlamento e o novo governo. Era um verdadeiro teatro político, aberto diante do povo, e ninguém mais podia voltar atrás. Para mim era o resultado da parte triunfal da Perestroika. Depois, em 1990, começou a parte mais dramática.

Le Monde - Falemos sobre a situação internacional, na Europa em particular, e a queda do muro de Berlim...
Gorbachev - Evidentemente, vivíamos transformações formidáveis. Em junho de 1989, eu estava em visita oficial na Alemanha Ocidental. Fui recebido de maneira muito calorosa, entusiasmada. Então, começaram a me fazer a pergunta abertamente: para quando é a reunificação da Alemanha? O chanceler Helmut Kohl e eu estávamos preparados para dizer que era evidente que esse problema deveria ser resolvido um dia, mas que não era da atualidade. Era mais um problema para o século 21. Nesse ponto, Helmut e eu estávamos de acordo.

Le Monde - Nesse ponto, o senhor também estava de acordo com François Mitterrand?
Gorbachev - Sim. E devo lhe dizer que todos meus amigos políticos, todos meus parceiros, eram partidários de um processo mais longo. François Mitterrand era favorável a uma espécie de confederação que poderia se fundar sobre dois pilares, a Comunidade Europeia no Oeste, e a Europa Oriental, reformada pela perestroika. Ele estava de acordo comigo para dizer que a Europa devia respirar com seus dois pulmões. Então cada um de nós fazia, à sua maneira, tentativas de prever a História. E todos nós nos enganamos.

Le Monde - A História saiu dos trilhos?
Gorbachev - Totalmente. A História desembestou. Em 9 de novembro, foi o Muro que se abriu, e depois, foi um turbilhão incontrolável. A História transbordou. Tínhamos consciência de que nossa política, a política em geral, era incapaz de acompanhar o processo histórico. Ao mesmo tempo, o outono de 1989 viu acontecerem as "revoluções de veludo" na Europa Oriental. Um processo ao mesmo tempo muito promissor e que continha perigos inéditos. De qualquer forma, era a natureza da História. Porque as mudanças na Europa Oriental e a redescoberta da soberania total por esses países levaram a mudanças importantes para o conjunto da Europa. Para mim, era o momento em que era preciso recomeçar a refletir sobre a construção da casa comum europeia.
Isso não funcionou porque, acredito, a Europa Ocidental e os americanos consideraram que era preciso interpretar todos esses acontecimentos como a falência do comunismo e a derrota da Rússia na Guerra Fria. Que era o triunfo dos valores do mundo ocidental. Para mim, é isso que explica o comportamento de meus amigos ocidentais, que eu classificaria como imprudente. Isso provocou a derrapagem de todo o processo, e foram necessários tempo e esforços para sair desse caos. Esse foi o ano de 1989. Esse ano definiu as bases do que veio a seguir.

Le Monde - A respeito da reunificação alemã: em que momento o senhor teve certeza de que a reunificação era inevitável?
Gorbachev - Já em outubro de 1989, no momento do 40º aniversário da RDA [República Democrática da Alemanha]. Uma grande manifestação havia sido organizada para esse aniversário. Em Berlim Oriental houve um desfile impressionante no qual estavam representadas todas as regiões da RDA. E eu via que os participantes procuravam se dirigir diretamente a mim: "Ajude-nos, ajude-nos!".

Le Monde - Um historiador americano escreveu que o senhor foi o primeiro e único dirigente soviético a ser popular tanto em Bonn quanto em Berlim Oriental, e também em Pequim, durante as manifestações estudantis da primavera de 1989...
Gorbachev- Sim, é verdade.

Le Monde - Mais popular, de qualquer forma, do que o governo da Alemanha Oriental...
Gorbachev - Para o 40º aniversário da RDA, Mieczyslaw Rakovski, o premiê polonês, estava na tribuna com o general Jaruzelski, bem atrás de mim. Ele falou em meu ouvido: "Mikhail Serguêievitch, você entende alemão? - O suficiente para entender o que os manifestantes proferem", eu disse. Rakovski: "Você entende que é o fim?" Pronto, foi assim. Em compensação, Erich Honecker (chefe do partido alemão-oriental) se comportava como se não entendesse mais nada. Ele cantava, estava disposto a dividir conosco esse entusiasmo artificial. Eu até tinha boas relações com ele. Mas toda vez ele me explicava que, talvez para a União Soviética a perestroika fosse algo de necessário, ao passo que na RDA as reformas já haviam sido feitas. Não eram necessárias mais mudanças. Quando encontrei toda a direção alemã-oriental, eu disse: aquele que chega tarde demais é punido pela vida. É verdade que para confirmá-lo eu me servia de meus próprios exemplos, do exemplo da URSS. Em seguida, evidentemente, entendi que a frase havia sido retirada de seu contexto, e que eu anunciava o fim da RDA.

No que diz respeito à reunificação, considerávamos fórmulas diferentes, por exemplo, a união monetária, uma confederação, etc. Em meados de dezembro de 1989, o novo chefe do governo da Alemanha Oriental, Hans Modrow, me ligou para dizer: não há mais outras variantes, só nos resta a unificação.

Eu tinha contatos regulares com os alemães ocidentais, com Hans Dietrich Genscher, o ministro das Relações Exteriores. Esses contatos eram essenciais. Uma vez passadas as festas de fim de ano, viam-se por toda a Alemanha manifestações em massa. Para mim, era o sinal de que era imprescindível mudar de política. Em 26 de janeiro de 1990, organizei uma espécie de seminário da direção da URSS para examinar as informações e os relatórios sobre todos os aspectos da questão alemã e da situação na RDA. Chegamos à conclusão de que era o momento de mudar de política e de levar em consideração as aspirações alemãs para a reunificação.

Le Monde - O senhor pode contar como se desenrolou o encontro de Kiev com François Mitterrand, em dezembro de 1989?
Gorbachev - Os acontecimentos na Alemanha preocupavam bastante François Mitterrand. Ele queria me sondar a respeito de minha avaliação da situação. Ele estava incerto quanto à sequência dos acontecimentos, mas pensava que não estavam indo bem. A atitude de François Mitterrand podia ser resumida com a famosa frase (atribuída ao escritor François Mauriac): "gostamos tanto da Alemanha que preferimos ter duas dela". Era ainda mais evidente para (a primeira-ministra britânica) Margaret Thatcher: na época, ela era agressivamente hostil à unificação da Alemanha. Mas, apesar de tudo, François Mitterrand e Margaret Thatcher deviam levar em conta as realidades e o fato de que o processo de reunificação estava em andamento. Eu sabia que Helmut Kohl estava em contato permanente com George Bush.

Finalmente, a solução encontrada para acompanhar esse processo era a fórmula "2+4": os dois Estados alemães e as quatro potências vitoriosas do Reich em 1945. Apresentamos claramente nossa posição: os alemães são livres para escolher eles mesmos as modalidades de seus acordos entre si. Mas no que diz respeito aos aspectos exteriores da reunificação, estes devem ser integrados em um acordo internacional. As questões territoriais, as fronteiras, tudo isso devia ser resolvido antes que a Alemanha se tornasse totalmente soberana.

Le Monde - O senhor fez alusão aos contatos estreitos entre o chanceler alemão e o presidente americano. O senhor tem a impressão de ter sido enganado por Helmut Kohl?
Gorbachev - Eu diria que ele tinha uma atitude ambígua. Tinha a impressão de que estávamos de acordo em cada etapa, de que havíamos nos entendido para não impedir os alemães de entrarem em acordo entre si, ao passo que o conjunto dos aspectos exteriores devia ser tratado nos consultando.

Mas nem tudo se passou assim. Não se pode esquecer que deveriam acontecer eleições na Alemanha Oriental. Helmut Kohl, depois de ver as grandes manifestações em Berlim Oriental e nas outras cidades alemães orientais, se esqueceu um pouco de seus comprometimentos. Ele soltou seu plano de dez pontos, sem nem consultar seu ministro de Relações Exteriores. Kohl agia em função dos interesses de seu próprio partido para garantir sucesso político para si. Mas, como um todo, os alemães se comportaram de maneira correta. Sobretudo no que diz respeito ao exército soviético, que permanecia na RDA. Eles cumpriram todas suas promessas, inclusive o abandono das armas de destruição em massa por parte da Alemanha. Todas as promessas, com exceção de uma: quando começou o processo de desintegração do pacto de Varsóvia, os ocidentais se puseram a estender a Otan para o Leste. Sob Clinton e Ieltsin.

Le Monde - No que diz respeito à entrada da Alemanha reunificada na Otan, o senhor havia entrado em acordo com Helmut Kohl, durante sua visita ao Cáucaso, em julho de 1990.
Gorbachev - Eu já havia dito a Bush que a Alemanha reunificada tinha o direito de escolher suas alianças. "Por que você tem tanto medo da Alemanha?", me perguntou o presidente americano. Eu lhe respondi que era ele que tinha medo, e que era por isso que eles preferiam tê-lo dentro da Otan. Segundo a famosa frase sobre o papel da Aliança Atlântica: "To keep the Russians out, the Americans in and the Germans down" ("Manter os russos fora, os americanos dentro, e os alemães por baixo").

Le Monde - O senhor acreditava que era melhor ter a Alemanha em uma aliança, mesmo a Aliança Atlântica, do que vê-la oscilando para o centro da Europa?
Gorbachev - Não, minha posição não era essa. Havíamos dado nosso consentimento para que a Alemanha reunificada decidisse por si mesma, uma vez recuperada sua soberania. Mas eu diria que, no final, havia uma espécie de cumplicidade entre Kohl e Bush.

Le Monde - No conjunto, que balanço o senhor faria desse ano de 1989? A Europa se libertou, muros caíram...
Gorbachev - Eu não falaria em acontecimentos positivos, mas sim de grandes acontecimentos. Eu colocaria em primeiro lugar as primeiras eleições livres na União Soviética. Depois, as "revoluções de veludo" nos Estados da Europa Oriental. Elas têm uma importância capital. Foi isso que encorajou os alemães para o caminho da unificação e que, portanto, levou à queda do Muro e à reunificação alemã. O próximo passo mais lógico é que durante nosso encontro em Malta (em dezembro de 1989) dissemos para Bush: não somos mais inimigos, a guerra fria terminou.

Le Monde - Uma declaração um pouco prematura?
Gorbachev - Evidentemente. Talvez devêssemos ter evitado começar a Guerra Fria, ou tê-la terminado mais cedo. Mas imagine o que teria acontecido se tivéssemos mantido sem mudança nossa política em relação à Alemanha, se tivéssemos continuado a manter uma certa desconfiança em relação à nação alemã? Em uma Europa liberta, não tínhamos nenhuma razão para continuar uma política de discriminação em relação à Alemanha. Eu diria que o fio condutor de todos esses acontecimentos foi o restabelecimento da soberania dos povos.

Le Monde - E o aspecto negativo?
Gorbachev - O negativo não está associado ao ano de 1989, mas sim ao que veio na sequência. É verdade que houve acontecimentos que poderíamos considerar negativos, mas eles eram secundários. Mesmo quando uma cozinheira prepara o bortsch, o prato nacional russo, ela pode se enganar na dose do tempero.

Tradução: Lana Lim

quarta-feira, novembro 04, 2009

Como era a vida no lado de lá nos tempos do Muro de Berlim

DIÁRIO DO CENTRO DO MUNDO
Paulo Nogueira

CERTAS COISAS, numa viagem, você faz num último e inexplicável impulso, em geral já correndo contra o relógio, e muitas vezes é ali que você vai encontrar o melhor momento dos dias que passou num determinado local. Aconteceu comigo em Berlim, para onde fui no final de outubro para escrever uma reportagem sobre os 20 anos da queda do Muro de Berlim, publicada na edição da Época que está nas bancas.

Minha mala já estava pronta na manhã da segunda-feira no bom hotel em que fiquei, o California, muito bem localizado na Kurfürstendamm, uma avenida no centro da cidade. Minha bagagem de mão, sempre pesada pelos livros que levo, uma orgia de letras exagerada mas da qual não consigo me livrar, também já estava preparada, uma mochila azul do Evening Standard cujo zíper eu até já fechara. Eram umas 10 horas e o avião para Londres sairia pouco depois das 15 de Schoenefeld, o aeroporto de Berlim utilizado pela Ryanair, a companhia européia barateira que disputa o mercado de quem não pode gastar muito com a EasyJet.

Fiz uma conta mental mas meticulosa e decidi ir para o outro lado da cidade, no que foi Berlim Oriental entre 1945 e 1989, rumo ao Museu da Stasi, a polícia secreta do governo comunista. Uns 40 minutos para ir, outros 40 para voltar, mais uma hora de visita. Ficaria apertado, mas daria. Pedi ao motorista de táxi que me esperasse, para ganhar um tempo que era escasso. O museu fica no que foi a sede da Stasi, que se declarava “o escudo e a espada” do partido no poder. É um prédio sombrio, soturno, triste, inteiramente preservado para que as pessoas possam ver sossegadamente, pagando três euros, o local em que os habitantes do pedaço oriental da cidade foram obsessivamente vigiados e, em muitos casos, submetidos a torturas pretensamente científicas. A Stasi é retratada muito bem em A Vida dos Outros, um filme que revi em Londres depois de ir ao museu. Não gosto de final melodramático, em que a mulher mesmo atropelada tem lucidez para dizer com clareza as últimas palavras, mas é um filme que mostra o que “o escudo e a espada” do partido fizeram contra o povo emparedado pelo muro.

Num documentário, vi a ânsia com que a multidão, tão logo liquidado o muro na noite de 9 de novembro de 89, se precipitou para a sede da Stasi, prudentemente esvaziada naquele momento. Quem pudera tudo já não podia nada senão escapar. Os alemães são ordeiros. Primeiro bateram na porta de vidro e, como ninguém estava lá para abrir, forçaram. Estava trancada, e então alguém quebrou o vidro, e a primeira visitação pública foi feita em circunstâncias inesperadas. Alguns meses depois, reunificada a Alemanha, a Stasi foi oficialmente extinta, mas “o escudo e a espada” àquela altura já estavam pendurados para a eternidade. Atarracado, sem pescoço como o primeiro general da ditadura militar brasileira, Castelo Branco, Erich Mielke, o temido e abominado chefe da Stasi desde 1957, ficou preso por algum tempo, foi libertado por razões de saúde e morreu em 2000 aos 92 anos. Seus restos estão enterrados numa cova anônima em Zentralfriedhof Friedrichsfelde, um conhecido cemitério de Berlim onde jazem muitos comunistas célebres alemães.

Ele era certamente o homem mais temido do país”, escreveu Anna Funder em seu premiado livro Stasiland - Stories From Behind The Berlin Wall (A Terra da Stasi — Histórias Por Trás do Muro de Berlim). “Temido pelos colegas, temido pelos membros do Partido, temido pelos trabalhadores e pela população em geral.” Funder conta que, numa reunião de trabalho em 1982, Mielke afirmou que nem a Stasi estava livre de traidores. “Se eu descobrisse um, no dia seguinte ele estaria morto. Porque sou um humanista é que penso assim.” Sobre as discussões em torno da pena de morte, ele disse: “Bobagem, camaradas. Executem. E, quando necessário, sem julgamento.” Na sala de Mielke, mantida tal como era, há uma máscara mortuária de Lênin, o chefe da Revolução Russa de 1917. Lênin e Stálin eram os heróis de Mielke. “Quem não está conosco está contra nós”, costumava dizer ele. “Quem está contra nós é nosso inimigo e nossos inimigos têm que ser eliminados.” Quando o poder de vida e morte enfim escapou de suas mãos, Mielke não foi eliminado por seus inimigos. Seus últimos anos foram passados num asilo para velhos.

A STASI MONTOU um aparato espantoso e caríssimo para patrulhar o povo, como se pode ver em A Vida dos Outros. Eram 85 000 funcionários e mais 170 000 informantes, o que dava uma proporção sem precedentes de espiões por pessoa num país de pouco mais de 17 milhões de habitantes. Num determinado momento, cada prédio público da Alemanha Oriental tinha pelo menos um informante. Nos escritórios de correio, havia sempre alguém para abrir e ler todas as cartas. Julia, uma alemã oriental que cedo foi punida e tratada como suspeita na terra em que vivia compulsoriamente, contou a Funder que uma vez, chamada para uma conversa por uma autoridade, foi colocada diante da revelação chocante de que todas as cartas que ela trocara com um namorado italiano tinham sido lidas. As palavras não entendidas pelos espiões, aquelas que fazem parte do código único de namorados, foram naquele dia submetidas a Julia. “O que é Cocoriza?”, perguntou o homem a Julia. É milho, em húngaro, e era como o namorado chamava Julia. O interrogador se achou no direito de dar conselhos amorosos a Julia. Anos antes, quase menina ainda, ela fora interrogada com o método mais empregado pela Stasi: a interrupção do sono por quanto tempo fosse preciso.

Visto em retrospectiva, chama a atenção o fracasso da lavagem cerebral tentada pelos dirigentes comunistas. Crianças, desde o jardim de infância, recebiam lições em que o comunismo era apresentado como o paraíso na terra e o capitalismo, demonizado. Entrevistada num documentário feito nos anos 50, uma moradora de Berlim Oriental que conseguiu escapar para o outro lado com seu filho e seu marido disse que a razão principal era a doutrinação da criança. Tanta doutrinação pôde pouco contra a realidade agastante dos fatos. Quando o muro foi erguido, mais de 2 milhões de alemães orientais já tinham ido para o outro lado, quase sempre deixando para trás casa e emprego. Num vídeo de menos de quatro minutos, em que não há palavras e sim uma música que comove e perturba ao mesmo tempo, você tem uma idéia clara de por que ninguém queria ficar ali, onde o pesadelo futurista do Grande Irmão do romance 1984 de George Orwell — que descreveu em 1949 uma terra em que o Estado tudo sabia e podia sobre os indivíduos — chegou mais próximo a realidade do que em qualquer outro lugar.

Era uma época realmente confusa. Havia, nos meses anteriores ao muro, um medo globalizado de que União Soviética e Estados Unidos passassem da Guerra Fria, em que um rosnava para o outro e exibia músculos, para um confronto nuclear capaz de aniquilar a humanidade. Um programa da BBC feito no auge da Guerra Fria mostrou Berlim tensa e depois levou o caso para um grupo de populares que fora juntado para debatê-lo. Vi este documentário outro dia, no ótimo Arquivo da BBC. Uma mulher, alarmada, disse mais ou menos o seguinte. “Na Segunda Guerra, pessoas foram sacrificadas em nome da civilização. Será que não deveríamos também fazer o mesmo agora?” Bem, ela se referia aos mais de 2 milhões de alemães orientais que tinham buscado refúgio no ocidente - um vazamento humano que estava por trás das hostilidades entre as duas superpotências nucleares e que foi o motivo da construção abrupta do muro. A mulher que sugeriu o sacrifício milionário foi, merecidamente, vaiada.

Não existe almoço grátis, disse o economista Milton Friedman num frase célebre. Toda a engrenagem montada e mantida para dar sustentação ao regime comunista tinha um custo que mais tarde seria cobrado. Quem viu A Vida dos Outros lembra que um teatrólogo sem nenhum perigo era vigiado 24 horas num esquema de revezamento incessante. Alguém tinha que pagar os salários, e mais as despesas decorrentes dos aparelhos usados etc. A pobreza do povo, em comparação ao dinamismo do outro lado, se originava, em parte, do custo da opressão. Você tem uma idéia clara do contraste em outro museu, o da História de Berlim, em que uma sala típica de classe média da Alemanha Oriental é reconstruída ao lado de outra sala típica de classe média da Alemanha Ocidental. Na primeira, limpa e organizada com é típico dos alemães, não há telefone, e a televisão é em branco e preto. Na segunda, as imagens são coloridas, e o telefone está presente, o clássico modelo negro.

Foi exatamente por questões de custo que o muro caiu. Em 1989, o primeiro-ministro da Hungria, Miklos Nemeth, foi examinar o orçamento em busca de cortes. Ele encontrou uma despesa considerável e foi investigar o que era. Era o dinheiro para manter o arame farpado na fronteira que a Hungria, então sob domínio soviético, fazia com a Áustria. Estimulado pela pregação renovadora de Mikhail Gorbachev, o novo líder soviético, Nemeth mandou cortar essa despesa. Pela Hungria, os alemães orientais podiam escapar da gaiola em que foram metidos. O itinerário era Hungria-Áustria-Alemanha Ocidental. Numa reportagem recente, a BBC chamou Nemeth de “herói não cantado” da liberdade.

Você desfruta o melhor de Berlim na parte ocidental: museus, restaurantes, zoológico, aquário, casas noturnas, lojas caras cujas vitrinas estão nas calçadas. Mas sem ir ao Museu da Stasi na sofrida área oriental, um prédio bege em que a atmosfera opressora é dada pelos retratos e bustos carrancudos de personalidades como Lênin, Stálin e Marx, sua viagem será menos rica.


Paulo Nogueira é jornalista e está vivendo em Londres. Foi editor assistente da Veja, editor da Veja São Paulo, diretor de redação da Exame, diretor superintendente de uma unidade de negócios da Editora Abril e diretor editorial da Editora Globo.