domingo, setembro 08, 2013

SÃO LUÍS EM TRANSE

“Desculpe os transtornos, estamos mudando o mudando o país”. Vocês, aí na plateia, sem dúvida alguma ainda se lembram muito bem dessa frase. Assim como muitas outras semelhantes a ela, foi escrita em centenas, milhares de cartazes nas manifestações de junho deste ano – cujo objetivo foi escancarar a banda podre da configuração político-administrativa que está aí.
            Maiakovski disse que “o mar da história é agitado”. E aqui no Brasil não teve apenas agitação. As ondas de contestação que sacudiram este país tropical eram furiosas, também. O aparelho policial à disposição do Estado para detonar gente desarmada – como aconteceu na desocupação do Residencial Nova Terra, mês passado – de repente se viu acuado.
Não esperavam que pacatos cidadãos de uma hora para a outra fossem partir para a ignorância, a fim de combater o status quo, formado por “representantes do povo” que nos últimos anos têm feito de tudo, exceto representar quem a cada dois anos é obrigado a tolerar o estorvo de se deslocar até uma seção eleitoral e participar da pobre “festa da democracia”, para qual rigorosamente ninguém o convidou.
Confusão no centro comercial, depredação, vandalismo e pancadaria não foram os únicos exemplos de extremos a que se chegou, durante as manifestações. A presidente da República foi simplesmente vaiada na abertura da Copa das Confederações. Para não ouvir a repetição dos apupos, a mandatária máxima da nação não compareceu ao jogo final, entre Brasil e Espanha, no Maracanã. Outro dia, um comentarista da nossa realidade política chamou-a de “poste eleitoral”. Alguém que teve a chance de colar sua figura ao carisma gigantesco de Luiz Inácio e se deu bem.
Não concordei muito com essa observação, até porque, se tal fenômeno tivesse ocorrido nas eleições municipais do ano passado, Roseana Sarney não teria dificuldade alguma em ajudar Washington Luiz a ocupar o gabinete principal do Palácio de La Ravardière. O vencedor do pleito é um indivíduo mais contestado do que elogiado. O mesmo se poderia dizer da Dilma hostilizada em junho. Podemos perceber que, por trás das atitudes de casca-grossa, a presidente é até bem-intencionada. Vocês notam que ela até se esforça bastante no sentido de fazer o que é certo. Não faz politicagem no cargo que lhe foi confiado. No entanto, teve de engolir as vaias porque fosse então (espero que isso tenha mudado, no curto prazo) incapaz de constatar que a qualidade da vida de muitos brasileiros não era (e continua não sendo) das melhores.
Nos idos de junho, o Brasil despertou de sua vergonhosa letargia por causa de módicos vinte centavos de real. Ainda que os movimentos responsáveis por esse feito nada desprezível tivessem carecido de uma estrutura mais política e menos passional, acredito que o recado foi transmitido: “Em 2014 tem mais, podem ter certeza”.
São Luís, por outro lado, vivenciou toda essa ruptura entre as velhas e perenes práticas corruptas e o desejo de recomeçar do zero, como o estabelecimento de uma forma de governar que de fato considere o cidadão comum, pagador de impostos, participante ativo do processo político e não mera peça de artilharia no confronto de interesses dos partidos.
Nossa capital – que hoje “comemora” 401 anos -, infelizmente não se livrou de seu transe. De sua paralisia, que permite a sucessão de descalabros, como a jovem que deu à luz na porta de uma maternidade porque a anterior, na qual procurou atendimento de urgência e emergência, alegou “ausência de leitos”.
Ou então o da violência. Vão à internet e pesquisem a respeito do número de assassinatos em São Luís. Fiz isso antes de digitar estas bem-traçadas. No início do mês passado, na Região Metropolitana de São Luís a Secretaria de Segurança (?) Pública registrou 411 assassinatos. Não tenho os números do começo de setembro, mas, nesse ritmo de guerra civil em que nos encontramos... Não sei, não.
Nos últimos dias deste mês, meu filho – Gabriel – vai fazer quatro anos. Certa vez, eu levei para dar uma volta pelo Centro Histórico. Ele gostou muito. É um menino inteligente. Não faço essa afirmação apenas porque sou um pai muito feliz e orgulhoso de sua maior criação. Não. Afirmo isso porque, assim como outros pais, professores e demais educadores deste e de outros países, tive o privilégio de constatar que só falta aos herdeiros do amanhã nascerem falando.

            Espero que Gabriel e seus pares consigam tirar São Luís deste transe absurdo e imoral. E que sejam capazes de compreender (como seus pais aprenderam de cor e salteado) que a vida – a nossa, a deles – sempre estará aqui.

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