quarta-feira, dezembro 31, 2008

SACUDINDO A POEIRA

2008 já era. Está na hora de abrir alas, porque 2009 deseja passar. Como sempre acontece, acho que será um ano bom. Tenho lá minhas resoluções de ano novo. Ler a maior quantidade de livros de que for capaz. Transar com a maior quantidade de mulheres à minha disposição. Escrever meu primeiro livro. Passar um mês em São Bento. Começar a correr. Voltar a malhar. Viver de incógnitas é comigo mesmo.
Acabei de falar com Bruna. Espero que ela se recupere. Não mereceu o fim de algo que considerava belo. Mas a vida é assim, suponho. Não vivi o suficiente ainda para determinar. Só o que existe é o que eu penso e sinto e amo.
2008 já era. 2009 agora é uma criança recém-nascida. Deixemos que brinque um pouco antes de crescer e desabrochar.

terça-feira, dezembro 30, 2008

A VIDA É UMA FESTA

Gilmar hoje quis saber como se escreve "Ernest Hemingway".

Não é preciso muito para aguçar meus sentidos literários. Corri até a minha estante (a "blindada", como diria meu amigo Raimundo Martins, que Deus o tenha) e dela retirei meu exemplar de "Paris é uma festa", do mesmo autor de "Por quem os sinos dobram" e "O sol também se levanta". A tradução é de Ênio Silveira.
"Estava na época do mau tempo", assim começa essa obra-prima da "geração perdida" - ainda que Ernest tenha imediatamente rejeitado este rótulo, gratuitamente estabelecido por Gertrude Stein. "Chegaria a qualquer momento", prossegue, "no fim do outono. Teríamos de fechar as janelas à noite, por causa da chuva, e o vento frio arrancaria as folhas das árvores da Place Contrescarpe. As folhas ficariam no chão, encharcadas, o vento atiraria a chuva contra os grandes ônibus verdes no ponto terminal, e o Café des Amateurs ficaria cheio de gente, suas janelas embaçadas pelo calor e pela fumaça lá de dentro. Era um café triste e mal administrado o Amateurs, onde os beberrões do bairro se apinhavam e do qual eu me mantinha afastado por causa do cheiro de corpos sujos e do azedo da embriaguez".
Aparentemente, o texto acima não deve ter dado muito trabalho ao autor quando o produziu. e na verdade não deu mesmo, posto que o tom é o de quem escreve sem preocupação com a perenidade da obra literária. Mas acredito que aí está o "pulo do gato" de Hemingway como escritor: o escrever sem pressa, pelo puro prazer da arte pela arte. Sem a preocupação do ganha-pão, sem a peso do trabalho. E vejam que preocupação na época em que os eventos mencionados transcorrem, preocupação era o que não faltava para Ernest, posto que justo nessa época ele decidiu abandonar o jornalismo para viver unicamente do que lhe poderiam render seus contos.
Essa aflição e incerteza, aliás, estão explícitas no capítulo "A fome como boa disciplina". "Se você não se alimentava bem em Paris", conta, "tinha sempre uma fome danada, pois todas as padarias exibiam coisas maravilhosas em suas vitrinas e muitas pessoas comiam ao ar livre, em mesas na calçada, de modo que por toda a parte via comida ou sentia o seu cheiro. Se você abandonou o jornalismo e ninguém nos Estados Unidos se interessa em publicar o que está escrevendo, se é obrigado a mentir em casa, explicando que já almoçara com alguém, o melhor que tem a fazer é passear nos jardins do Luxembourg, onde não via nem cheirava comida, desde a Place de l'Observatoire até a rue de Vaugirarard".
Aqui na internet, "pesco" a seguinte observação do senhor Eduardo Hakk (http://www.eduardohaak.kit.net/hemingway.html):
"O livro é, por excelência, um volume de fuxicos, de irrelevâncias deliciosas que, se por um lado não oferecem grandes verdades aos leitores (seja lá que merda signifique 'grandes verdades'), por outro humanizam essas figuras todas do modernismo: Gertrude Stein, Ezra Pound, Ford Maddox Ford, James Joyce e tutti quanti - pra não falar do próprio Hemingway".
E, quando o assunto são as "irrelevâncias deliciosas", porque não dizer que "Paris é uma festa" está impregnado de vida? Desse nosso absolutamente fabuloso cotidiano, cheio de bons e de maus momentos? Lembro agora de Los Hermanos: "Todo carnaval tem teu sim". Concordarei com essa grande verdade só no fim da minha jornada. Que seja esse, então, meu epitáfio. Mas não agora. Não agora.
Agora, quero repetir todo santo dia que é a vida, mais do que a morte, a que não tem limites.
Quero repetir que a vida é uma festa.
E tenho dito.