segunda-feira, janeiro 25, 2010

A ÚLTIMA QUE MORDE

Como diria a Magda, “a esperança é a última que morde”.

Acabo de ler o artigo de um homem que, por dever de ofício ou talvez (porque não o conheço) por sua formação, é um otimista incorrigível.

O título da peça em questão é: “O Haiti não está só”. Foi publicado na “Folha de S. Paulo” de quinta-feira – 21/1 – e escrito pelo secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), o senhor Ban Ki-Moon. E assim principia:

“A catástrofe no Haiti demonstrou algo que nós sempre soubemos: mesmo na maior devastação, há esperança. Vi isso com os meus próprios olhos nesta semana, em Porto Príncipe. A ONU sofreu a maior perda de sua história. Nossa sede na capital haitiana era um amontoado de concreto despedaçado e aço retorcido. Como poderia alguém sobreviver?, pensei”.

Quem assistiu às imagens feitas por aquele soldado, mostradas pelo “Fantástico”, dos instantes seguintes ao desabamento da igreja na qual morreu Zilda Arns também deve ter feito a mesma pergunta. E deve ter observado – ao testemunhar a imagem do Cristo crucificado ilesa diante do templo destruído – como os desígnios divinos podem ser interessantes... naturalmente de uma forma totalmente incompreensível para nós, pobres pecadores.

Ban Ki-Moon também acredita no miraculosamente impossível:

“No entanto, logo depois de partir, com o coração pesado, as equipes de salvamento retiraram um sobrevivente dos escombros - vivo, após cinco dias enterrado, sem água nem alimentos. Considero isso um pequeno milagre, um sinal de esperança. Catástrofes como a do Haiti nos lembram a fragilidade da vida, mas também reafirmam nossa força. Vimos imagens horrendas na televisão: edifícios destruídos, cadáveres nas ruas, pessoas precisando de alimentos, água e abrigo. Vi tudo isso e mais ao andar pela cidade em ruínas”.

Bem que poderia ter feito uma escala em São Paulo. A descrição do parágrafo acima cairia feito uma luva na maior e pior cidade do Brasil. Na madrugada da mesma quinta-feira em que li o texto do senhor Ban Ki-Moon e agora escrevo estas bem-traçadas linhas, pelo menos nove pessoas morreram em deslizamentos causados por um violento temporal. De fato, o Haiti não está só. Mas pensando bem São Paulo pode até respirar aliviada. Podia ser pior: o prefeito de lá poderia ser João Castelo.

Maldade gratuita das 23h49 à parte, li no artigo de Ban Ki-Moon o desejo do secretário de ver o Haiti devidamente cicatrizado e restaurado. “Durante minha breve visita”, escreveu, “falei com muitas pessoas comuns. Perto das ruínas do palácio presidencial, um grupo de jovens que deseja ajudar a reconstruir o país”. E adiante:

“Do outro lado da rua, vi uma jovem mãe com seus filhos numa tenda, num parque público, com poucos alimentos. Havia milhares na mesma situação. Ela me disse, assim como outras pessoas, que esperava que a ajuda chegasse. ‘Vim trazer esperança’, disse-lhe: ‘Não desesperem’. E ela pediu que a comunidade internacional ajudasse o Haiti - pelos seus filhos, pelas gerações de amanhã”.

Aí está, senhoras e senhores. Esperança é isso: a capacidade de acreditar que podemos construir um futuro melhor a partir de escombros, sangue e muitas lágrimas.

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