terça-feira, maio 14, 2013

CASSAS E A CIRCULATURA DO QUADRADO


O ano era 2008. Meados de abril, para caprichar na exatidão. Aqui no Maranhão, de acordo com pesquisa da Escutec, a maioria da população reprovava – quase 60% dos entrevistados – a administração do então governador, Jackson Lago. Também com tristeza absoluta, recordamos a morte do mestre de obras Airton Castro e a do servente Wanderson Silva, que pereceram no desabamento do pilar de sustentação da obra do Hospital São Domingos. Aqui em São Luís, o São José (que na época era time de verdade e não esse “coiso” recém-rebaixado) recebia o Imperatriz a fim de somar pontos suficientes rumo à Série C do Campeonato Brasileiro. E lá no Rio de Janeiro Botafogo e Flamengo se enfrentavam pela semifinal da Taça Rio.
            Qual será o time do coração de Luís Augusto Cassas? Vou arriscar: Botafogo, no Rio, e Maranhão Atlético, aqui na terrinha.Faço estas elucubrações em plena convocação da Seleção Brasileira que vai disputar a Copa das Confederações. Marin, o presidente da Confederação Brasileira de Futebol, acaba de dizer que tem “a maior confiança” no trabalho da comissão técnica verde-amarela.
            O que será que Cassas pensa a respeito dessa Seleção? Acredita que vencerá as Confederações e a copa do ano que vem? Ou, como eu, imagina que ela vai dar com os canários n’água nas duas competições?
            Mas lá em abril de 2008 Luís Augusto Cassas mostrava pela enésima vez que o bolão que ele batia mesmo era – ainda é – no gramado da poesia. Nesse período de sua vida, alheio a pesquisas, a governos pessimamente avaliados e a vidas ceifadas sem mais nem menos e de uma hora para a outra, o mestre de “A poesia sou eu” alargou seus horizontes líricos a partir do momento em que abordou sua condição de portador de câncer na próstata.
            Sei mais ou menos como se comporta um indivíduo que descobre que está com câncer. Porque só tem mesmo noção do que essa pessoa passa e enfrenta quem se encontra no mesmo barco ou, mesmo não estando doente, decide ajudá-lo a enfrentar mal, sentindo as navalhadas que a má estrela dá na carne e no espírito.
            Cassas resolveu combatê-lo com orações aliadas à meditação zen-budista, incorporada as suas crenças, dessa forma afastando gradativamente o desespero e solidificando a esperança nas 40 sessões de radioterapia a que se submeteu no Hospital da Beneficência Portuguesa. E nessas sessões surgiram os “Poemas para iluminar o trópico de câncer”. Um deles é “A cura”, que nos diz: “quando os olhos/ daquele que é/ absolutamente nada// chorarem pelos olhos/ daquele que é/ absolutamente todo// e as lágrimas claras/ do absolutamente todo/ lavarem os ciscos dos olhos// do absolutamente nada/ então veremos às claras/ tudo absolutamente novo”.
            Jogo de palavras a partir do qual o poeta ressalta o processo de iluminação a que se submeteu para enfrentar a dificuldade de que padecia desde o ano anterior. E percebam o círculo se fechando, do “absolutamente todo” para o “absolutamente nada” e do nada para o todo absoluto – do homem para o divino, do efêmero para o infinito. É o que, pensou eu, o escritor Airton Paschoa chamou de “Circulatura do quadrado”:
            “Indo de um canto a outro e deste àqueloutro e destrouto ao penúltimo e do penúltimo ao último canto, perfaz-se um quadrado. Perfazendo-o vida afora, em que pese a distração com a poeira que levantamos, observa-se com justeza que o último confina palmo a palmo com o primeiro canto. Não deixamos de perfazê-lo por isso, notando embora requerer sempre mais e mais esforço, à medida que mais e mais nos faltam forças. – Mas há o pó, o pó! o tom subindo, subindo e descendo em sua infinita variedade, e a réstia de sol, volta e meia nos dizemos, erguendo a coluna”.
            Luís Augusto Cassas aceitou esse esforço diário, em busca da réstia de sol que possibilitará os versos e porventura os reversos que brilham dentro de si ou mesmo ainda se encontram escondidos da glória de estar vivo.

Nenhum comentário: