terça-feira, outubro 19, 2010

LIVROS ESSENCIAIS

Como qualquer lista de livros importantes, a das “obras essenciais para a humanidade” não passa de mero exercício de subjetividade. Por mais que sejam utilizados métodos especializados de seleção, acredito que sempre alguém vai bradar da platéia: “Ah, faltou aquela obra-prima”.
Há alguns dias, deparei-me com o volume 1 da “Coleção Super Essencial” – da revista Super Interessante, publicada pela Editora Abril. O título dessa edição especial é justamente “101 livros que mudaram a humanidade”. Do alto da minha experiência de leitor inveterado e formador de biblioteca (a minha, logicamente), posso dizer que tenho meus pontos de discordância e de concordância a respeito do que vi.
Depois de um cara ou coroa básico, resolvi começar pelas discordâncias. Logo de cara, talvez escandalize os mais puritanos: para mim, “Dom Casmurro” não pode ser relacionado como uma das obras que modificaram a espécie humana. A justificativa dos autores da revista: “Machado de Assis criou personagens-símbolo na literatura mundial (o livro foi traduzido para 19 idiomas) e é um dos marcos do realismo na literatura brasileira. O escritor explora todas as nuances psicológicas de seus personagens, que carregam traços ao mesmo tempo de heroísmo e fragilidade e sentimentos contraditórios, como amor e ódio”. Marco do realismo na literatura brasileira? Perfeito. Quanto às “nuances psicológicas”, não foi melhor do que Henry James – considerado sua contraparte européia. Mesmo a eterna dúvida da infidelidade de Capitu jamais me pareceu forte o suficiente para se colocar na lista de “grandes enigmas humanos”.
Outra obra cuja presença na lista do especial discuto com veemência: “Frankenstein”. Explicação da revista: “Surgido após um período de grande avanço das ciências, o movimento romântico foi em boa parte uma reação à idéia do Universo concebido como máquina. ‘Frankenstein’ foi a mais contundente crítica a esse novo cientificismo, que tudo desejava explicar e dominar”. Meu ponto de vista: apesar desse viés que já se aproxima do que um dia viria a ser entendido como “linguagem moderna”, o (ótimo) romance de Mary Shelley é radicalmente uma história de terror. Mas não é a história de terror. Esse papel atribuo tranqüilamente a “Drácula”. Além de conter o tal cientificismo abordado por Shelley, ainda é uma história de amor por excelência – de amor eterno, sobrevivente às maresias do tempo.
Passemos às concordâncias. Preciso dizer que a revista acertou em cheio com “Dom Quixote”? É a grande comédia da história da literatura. O grande romance de aventuras. O grande drama. A mescla perfeita entre maneirismo e barroco. O deslocamento da trama do patético para o burlesco. Vejo também na lista “On the Road – Pé na Estrada”, de Jack Kerouac. A obra-prima da famosa “Geração Beat”, cujos participantes foram por assim dizer os ancestrais do movimento hippie. Afinal de contas, os poetas, escritores e artistas que dela fizeram parte simplesmente um dia “pegaram a viola, colocaram na sacola e foram viajar”. E nessa aventura de girar pelos Estados Unidos por estradas por eles até então desconhecidas, foram criando aqui e acolá sociedades alternativas, nas quais os limites impostos eram os estabelecidos pela criatividade de elementos como Allen Ginsberg e o próprio Kerouac.
No fim das contas, entre acordos e desacordos, tenho a lamentar o esquecimento de obras basilares para a literatura mundial. Como deixar de lado “Cem anos de Solidão”, de Gabriel García Márquez? Ou então “Os irmãos Karamázov”, de Dostoiévsky? Colocaram “Dom Casmurro” na lista. Muito bem. Mas eu acharia melhor a inclusão de “Memórias póstumas de Brás Cubas”. Escolheram “Orlando”, de Virginia Woolf. Pois eu preferia ver no lugar desse livro qualquer dos romances de Jorge Amado. Tenho certeza de que você aí tem as suas preferências.
Qual foi o grande livro que alterou seu jeito de ser e de refletir antes de modificar esta vã humanidade?

Um comentário:

Gladson Fabiano disse...

Ney, só tenho uma coisa a falar...
“Ah, faltou aquela obra-prima”.
XD
Grande Abraço Amigo.