sexta-feira, junho 03, 2011

HOMEM-ARANHA: NOIR

Volta e meia, as grandes editoras de quadrinhos submetem seus principais personagens a poderosos exercícios de imaginação. Na DC Comics, por exemplo, Batman viveu aventuras inspiradas em clássicos do cinema como “Cidadão Kane” e “Os Intocáveis”. Entre peripécias alternativas semelhantes, o Superman foi inclusive adotado por Josef Stalin e tornou-se o legítimo “Homem de Aço” da União Soviética.
Em comparação, a Marvel tem dado boas respostas – a começar pelo Universo Ultimate, no qual seus principais personagens rceberam empolgantes reinterpretações. Foi criado com o objetivo de cativar leitores adolescentes e as gerações mais velhas que antes não se interessavam por HQs e gostaram dos filmes de super-heróis que foram para a Sétima Arte, como a trilogia “X-Men”.
Mas o atual manda-chuva da Marvel, o editor-chefe Joe Quesada, resolveu não parar no Ultimate e deu carta branca aos roteiristas David Hine e Fabrice Sapolsky e ao desenhista Carmine Di Giandomenico para a elaboração do ótimo “Homem-Aranha: Noir”, publicado no Brasil pela Panini Books.
Antes de mais nada: o que diabos significaria esse “noir”?
Trata-se da forma abreviada da expressão francesa “film noir” (“filme preto”), um estilo cinematográfico associado a filmes policiais originados dos romances de suspense da Grande Depressão (1929) e das películas de terror dos anos 1930 – como o bom e velho “King Kong”, de 1933.
Mas por que exatamente “noir”? Quando apareceram, no início da década de 1940, foram filmados em preto e branco e continham uma atmosfera de fatalismo, injustiça e atitudes bastante pessimistas e em até certo ponto cínicas. Ou seja, com toda a carga negativa (sem intenção de ressaltar preconceitos, lógico) geralmente atribuída aos vocábulos “preto” ou “negro”.
Em “Homem-Aranha: Noir”, o integrante do elenco que apresenta um comportamento mais “para-baixo” é Ben Urich, fotógrafo e repórter do jornal “Clarim Diário”. Desiludido e sem a menor esperança quanto ao que restou de seu mundo logo após a Depressão, Ben sai às ruas de Nova York com sua máquina fotográfica e registra os rostos de homens e mulheres arruinados e de crianças maltrapilhas e famintas.
Isso até encontrar os socialistas May e Peter Parker. Tia e sobrinho tentam transmitir à população faminta e empobrecida o ensinamento do falecido Ben Parker: “Se aqueles que detêm o poder não são dignos de confiança, é dever do povo destituí-los”. Uma crítica direta à rede de corrupção que se espalhou em todos os escalões da administração pública da grande metrópole norte-americana em razão da forte influência criminosa imposta por Norman “Duende” Osborn, o trio dos Executores e os participantes de seu circo de aberrações: Kraven, o Camaleão e o Abutre comedor de carne humana (responsável pelo assassinato e mutilação do corpo de Ben Parker).
Na tentativa de livrar Nova York desses facínoras, Peter Parker é acidentalmente picado por uma aranha mística e recebe as famosas “força e agilidade proporcionais às de um aracnídeo”. Além da teia orgânica, é claro. Só existem dois aspectos interessantes nesse Homem-Aranha dos anos 30: ele usa uma arma de fogo e não hesita em matar seus adversários, como os justiceiros implacáveis do film noir.
Lançada nos Estados Unidos em 2009 como minissérie e aqui no Brasil em um encadernado de luxo (e barato, o que é melhor), “Homem-Aranha: Noir” acertou em cheio ao colocar personagens por si fascinantes sob perspectivas surpreendentes.

Nenhum comentário: