terça-feira, fevereiro 07, 2012

DICKENS - 200 ANOS

Para começo de conversa, Dickens foi um visionário.
Sabem como é que um homem dotado de vislumbres do amanhã faz para se consagrar entre seus contemporâneos e perpetuar seu nome na História? É desse jeito: dar forma a obras-primas que a maioria das pessoas considera absurdas antes que saiam da mente ou da prancheta.
E Dickens foi um visionário porque criou a novela e os seriados televisivos modernos.
Deve ter acontecido assim: alguma de suas ótimas histórias talvez não tivesse obtido os aplausos imediatos do público e da crítica. É um exercício de imaginação de nossa parte, claro, mas fico a imaginar Charles sentado à sua mesa de trabalho e dizendo de si para consigo: "Vem cá, porque é que não faço algo em série? Algo que prenda a imaginação do leitor até o episódio seguinte"?
"À espera de um milagre", de Stephen King, nasceu com essa proposta. E o mestre de "Tripulação de esqueletos" não deixou de dar o devido crédito a seu "mentor":
"Houve uma ou duas ocasiões em que perguntei a mim próprio se Charles Dickens teria sentido a mesma coisa, com a esperança de que as questões levantadas pelo enredo encontrassem as respostas em si mesmas; suponho que ele deve ter passado pela mesma coisa. Felizmente para ele, Deus concedeu ao velho Charles um pouco mais no departamento do talento".
E esse talento se cristaliza com este trecho de "Um conto de Natal":
– Bom Natal, meu tio, e que Deus o ajude! – exclamou uma voz jovial.
Era a voz do sobrinho de Scrooge, cuja entrada no escritório fora tão imprevista, que este cordial cumprimento
foi o único aviso com que o rapaz se fizera anunciar.
– Tolice! Tudo isso são bobagens!
O sobrinho de Scrooge, que havia caminhado apressadamente no meio da bruma gélida, tinha o rosto incendiado
pela corrida. Seu rosto simpático estava vermelho, os olhos brilhavam, e, quando falava, seu hálito quente transformava-
se numa nuvem de vapor.
– Natal, uma bobagem, meu tio? Parece que o senhor não refletiu bem!
– Ora! – disse Scrooge. Feliz Natal! Que direito tem você, diga lá, de estar alegre? Que razão tem você de estar
alegre, pobre como é?
– E o senhor – respondeu alegre e zombeteiramente o sobrinho –, que direito tem de estar triste? Que razão tem
o senhor de estar acabrunhado, rico como é?
Não encontrando no momento melhor resposta, Scrooge repetiu novamente:
– Tolice! Tudo isso são bobagens!
– Vamos, meu tio! Não se amofine! – disse o jovem.
– Como não me amofinar, – replicou o tio, – quando vivemos num mundo cheio de gente ordinária? Feliz Natal!...
Que vá para o diabo o seu feliz Natal! Que representa para você o Natal, a não ser uma época em que você é
obrigado a abrir o cordão da bolsa já magra? Uma época em que você se faz mais velho um ano e nem uma hora
mais rico? Em que você, fazendo um balanço, verifica que ativo e passivo equilibram, sem deixar nenhum resultado?
– Se fosse eu quem mandasse, – continuou Scrooge indignado, – cada idiota que percorre as ruas com um “feliz
Natal” na ponta da língua seria condenado a ferver em sua marmita, em companhia de seu bolo de Natal, e a ser
enterrado com um galho de azevinho espetado no coração. Pronto!
– Meu tio! – exclamou o jovem.
– Meu sobrinho, – tornou o tio num tom severo –, pode festejar o Natal a seu modo, mas deixa-me festejá-lo
como me aprouver.

Charles Dickens nasceu no dia 7 de fevereiro de 1812. Aqui no Brasil, já praticamente respiramos o Reinado de Momo. Como será que Dickens se sairia escrevendo sobre o nosso bom e velho Carnaval? Só um outro exercício de imaginação para dar essa resposta.

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