segunda-feira, agosto 18, 2008

POR TRÁS DA MINIGUERRA NO CÁUCASO, O XADREZ GEOPOLÍTICO

Parece que os Estados Unidos se enganaram redondamente quando imaginaram ter alguma espécie de privilégio de superpotência em sua partida contra a Rússia
(Publicado na Folha de São Paulo - domingo, 17 de agosto de 200 - tradução de Clara Allain)

IMMANUEL WALLERSTEIN, pesquisador sênior na Universidade Yale, é autor de "O Declínio do Poder Americano"

O mundo testemunhou nesta semana uma miniguerra no Cáucaso, e a retórica tem sido intensa, embora em grande medida irrelevante. A geopolítica é uma série de gigantescas partidas de xadrez disputadas entre dois jogadores, nas quais estes buscam posições de vantagem. Nessas partidas, é crucial conhecer as regras vigentes que regem os lances. Os cavalos não podem andar na diagonal.
Entre 1945 e 1989, a partida principal de xadrez era disputada entre os Estados Unidos e a União Soviética. Ela se chamava a Guerra Fria, e as regras básicas do jogo eram conhecidas metaforicamente como "Yalta". A regra mais importante dizia respeito a uma linha que dividia a Europa em duas zonas de influência.
Essa linha foi chamada por Winston Churchill de "Cortina de Ferro" e se estendia de Stettin a Trieste. A regra dizia que, não importasse quanta turbulência fosse instigada na Europa pelos peões, não haveria guerra de fato entre os Estados Unidos e a União Soviética. Ao final de cada instância de turbulência, as peças voltariam a suas posições originais.
Essa regra foi respeitada cuidadosamente até a queda dos comunismos, em 1989, marcada mais notadamente pela destruição do Muro de Berlim.
É inteiramente verdade, como todos observaram na época, que as regras de Yalta foram anuladas em 1989 e que a partida disputada entre os Estados Unidos e (desde 1991) a Rússia mudou de maneira radical.
O maior problema desde então é que os Estados Unidos não compreenderam direito as novas regras do jogo. Eles se proclamaram, e foram proclamados por muitos outros, a única superpotência mundial. Em termos de regras de xadrez, isso foi interpretado como significando que os Estados Unidos tinham liberdade para movimentar-se pelo tabuleiro de xadrez como bem entendessem e, especialmente, para transferir antigos peões soviéticos para sua esfera de influência. Sob Clinton, e mais notadamente sob George W. Bush, os Estados Unidos passaram a jogar a partida dessa maneira.
Só havia um problema nisso: os Estados Unidos não eram a única superpotência mundial - nem sequer eram uma superpotência.





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