quinta-feira, outubro 18, 2007

Paulo Autran

Coluna do Sarney

O ESTADO DO MARANHÃO. SÃO LUÍS, 19 DE outubro DE 2007, sexta-feira.


São Luís do Maranhão, uma das cidades mais antigas do Brasil e onde se encontra preservado o maior conjunto da arquitetura colonial portuguesa, tinha no teatro uma devoção cultural. Basta dizer que a Igreja de Nossa Senhora da Luz foi inaugurada, em 1617, com uma representação teatral, diálogos compostos pelo padre Luís Figueira, um dos mártires jesuítas da evangelização da Amazônia.
O Teatro São Luís é o segundo do Brasil. Foi construído por iniciativa privada e inaugurado em 21 de junho de 1816, com o nome de Teatro União. No tempo da navegação a vela, São Luís era o porto mais próximo da Europa, 28 dias, viagem favorecida pelos ventos e correntes marítimas, e ali primeiro aportavam as companhias líricas que vinham apresentar-se no Brasil.
Havia o gosto do teatro e cada sobradão guarda até hoje um espaço que era obrigatório para o seu teatrinho, onde as famílias cultivam essa arte.
O Teatro São Luís foi construído tendo como modelo o Scala de Milão, em tamanho pequeno, aconchegante, belo. Tem um ar de uma casa em que todos participam do espetáculo, tão próximos ficam platéia e artistas. Por ali passou Furtado Coelho, aquele cuja mulher, Eugênia Câmara, era a musa e amante de Castro Alves. Num camarim nasceu a maior atriz brasileira de todos os tempos, Apolônia Pinto. O teatro tinha assinantes e as óperas e operetas eram as grandes atrações da cidade.
Nesse teatro, onde, por tradição e uma certa superstição nos meios artísticos, dava sorte estrear, conheci Paulo Autran na década de 50. Nós fundáramos uma Sociedade de Cultura Artística (SCAM) com a professora Lilá Lisboa, Lucy Teixeira, Lago Burnett, e recebíamos e nos fazíamos de cicerones aos artistas que nos visitavam. Lembro-me que acompanhei Henriette Morineau, Tônia Carrero, Maria Della Costa e Paulo Autran.
Com Paulo, Henriette e Tônia fizemos uma amizade bem forte. Com que encanto e nostalgia lembro-me das noites gloriosas do Otelo e do Entre Quatro Paredes, o público em delírio, e do tempo de Tônia - essa beleza que não passa - e Paulo na sua companhia com Adolfo Celi.
Ninguém no Brasil representou tanto o chamado a uma vocação artística quanto Paulo Autran. Encheu o coração de sua geração e das novas gerações. Grande e magnífico ator - o maior de todos. Criatura extraordinária. Quando presidente, o mandei convidar para ministro da Cultura: ele não aceitou, nem Fernanda Montenegro. Perdi eu. Foram fiéis ao teatro, mais do que eu à literatura.
Sua morte deixa a lembrança da frase de Rilke sobre Rodin: “Todos os grandes homens já morreram.”

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