domingo, julho 26, 2009

Roland Barthes volta à moda

Originalmente publicado em 1967, Sistema da moda (Martins Fontes, 480 pgs. R$59,90) é uma obra representativa da onda semiológica que prosperou durante mais de uma década no pensamento francês (com uma longevidade ainda maior na sua filial, a universidade brasileira, sempre atenta - e às vezes submissa - ao mercado parisiense das idéias). É, em resumo, um exercício engenhoso de aplicação de uma análise semântica a um fenômeno cultural, isto é, Barthes toma a moda como uma linguagem e tenta decifrar seu vocabulário, sua gramática, sua sintaxe. Partindo de artigos publicados em revistas especializadas no vestuário feminino, ele examina não somente a estrutura e o significado do discurso sobre a moda, mas também a própria moda como um discurso.

Ao desvendar esse sistema de significações, ele revela as regras invisíveis que determinam o revezamento incessante de gostos e tendências ao longo dos anos. Mas, a rigor, a moda é apenas pretexto para um empreendimento teórico frio, quase impessoal, que poderia eleger como objeto qualquer outro fenômeno da cultura - o que Barthes fez em outros textos, aliás. Para quem tem uma relação emocional mais próxima com o mundo fashion, a leitura poderá parecer árida e excessivamente intelectualizada. Ainda assim, Sistema da moda é, ao lado de O império do efêmero, de Gilles Lipovetsky, um dos frutos mais interessantes do casamento entre a inteligência e a futilidade, entre o conteúdo e o estilo.

Sistema da moda dá seqüência à reedição sistemática (sem intenção de trocadilho) das obras de Roland Barthes pela editora Martins Fontes, incluindo volumes com a transcrição dos cursos do pensador no prestigioso Collège de France (A preparação do romance, Como viver junto) e outros textos inéditos (Escritos sobre teatro, Imagem e moda), além dos já clássicos O rumor da língua e Fragmentos de um discurso amoroso, que tiveram influencia decisiva sobre a teoria da arte e da literatura e o desenvolvimento das ciências humanas.

A iniciativa sugere que a demanda por Barthes continua, quase 30 anos após sua morte, em 1980 - o que é confirmado pelo lançamento de Roland Barthes - O ofício de escrever, de Eric Marty (Difel, 384 pgs.R$49), que não é uma biografia, mas uma reunião de ensaios que fazem um inventário sobre as diferentes fases da obra de Barthes - de quem Marty foi aluno e amigo - o que também dá ao seu livro um tom de viagem sentimental, de reflexão pessoal sobre a relação entre mestre e discípulo. O ofício de escrever é dividido em três partes: “Memória de uma amizade”, relato autobiográfico que conta o transcorrer cotidiano dos últimos anos do escritor; “A obra”, que percorre e mapeia a toda sua produção; e ”Sobre Fragmentos de um discurso amoroso”, reunindo textos críticos que interpretam seu livro mais conhecido e suas “estratégias subterrâneas”.

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