O bilhete da loteria rasgado abandonado no assoalho
imundo do ônibus
passa
a imagem do seu ex-dono dizendo para si mesmo
“Ainda
não foi desta vez!”
O
homem que põe as mãos na tampa do caixão que guarda
o corpo
de sua esposa pouco antes da primeira pá de terra
ergue
o rosto para o céu e tenta entender o como e a finalidade
o menino que empina a pipa depauperada desvia o rosto
coberto
de suor e terra da carícia do pai ausente e antes de voltar correndo
para
os seus amigos de linha e cerol diz ao homem que vai vê-lo
apenas
nos fins de semana: “A mamãe tá em casa. Vai falar com ela”
E o
bêbado que se equilibra na calçada tão destroçada quanto sua vida
perde
o controle da bexiga lava os pés imundos e as japonesas gastas
ouve
o gracejo de um mototaxista e dispara pela avenida atrás do engraçadinho
as pernas bambas por
demais ébrias
e então na direção contrária aparece um ônibus lotado
e
quando se percebe em perigo real e imediato o bêbado outrora equilibrista
decide
enfrentar o ônibus com o dedo médio em riste lembrando-se
no derradeiro
segundo daquele antigo brega:
“E
QUE TUDO O MAIS VÁ PRO INFERNO!”
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