INTERNATIONAL HERALD TRIBUNE
Para mim, a Ferrari é o elemento mais importante da minha vida", diz Luca Cordero di Montezemolo, 61, presidente da Ferrari (centro)
Luca Cordero di Montezemolo, 61, é presidente da Ferrari desde 1991, e supervisiona tanto a fabricação dos carros esportivos quanto a equipe de corrida. Sua primeira tarefa na equipe começou em 1973 quando foi contratado como assistente do fundador, Enzo Ferrari, antes de se transformar em gerente da equipe no ano seguinte. Ele também se envolveu com o futebol e o iatismo. Foi presidente da Fiat de 2004 até deixar o cargo há duas semanas. Ele também está à frente da associação da indústria italiana Cofindustria. Montezemolo conversou com Brad Spurgeon do International Herald Tribune em seu escritório na Ferrari, em Maranello, Itália.
IHT: O que a Ferraria significa para você pessoalmente?
Montezemolo: Para mim, a Ferrari é o elemento mais importante da minha vida, porque eu entrei para a companhia quando tinha 24 anos de idade. Saí direto da Universidade de Columbia em Nova York e fui para Maranello para ser o assistente de Enzo Ferrari em 1973.
Espero que aqui em Maranello você tenha percebido algo que para mim é muito importante nessa companhia: a qualidade de vida na fábrica, o processo tecnológico, tudo é muito voltado para um pensamento no futuro –isso é crucial– e ao mesmo tempo mantemos uma forte ligação com nossa tradição, com nossa herança, com nossa história. É crucial porque sempre que você vê um carro nos Champs-Elysees ou em Toronto, mesmo sem o emblema da marca, você reconhece que é uma Ferrari.
IHT: Como as coisas mudaram desde que você começou na Ferrari?
Montezemolo: Basicamente, o que aconteceu na Ferrari também aconteceu no mundo e com as fabricantes de carros em geral. Quando voltei para a Ferrari, tive duas reações. Primeiro me senti à vontade porque reencontrei muitas pessoas com que eu havia trabalhado nos anos 70, então me senti em casa. Por outro lado, houve um salto incrível na Fórmula 1 dos anos 70 até os 90 –também no carro de rua, mas principalmente na Fórmula 1– e minha primeira questão foi: por que nós não tínhamos ganhado nenhum título nos últimos 20 anos? E a resposta que dei a mim mesmo foi que os anos 80 giraram em torno da aerodinâmica e os engenheiros vieram da Aeronáutica, e não dos carros de rua. E nosso know-how estava baseado na engenharia mecânica. O começo dos anos 90 girou em torno da eletrônica. Então fomos os primeiros a introduzir na Fórmula 1 a transmissão automática com “paddle shift” e a transferi-la para os carros de rua.
A outra grande diferença foi que em 1996 eu decidi renovar completamente a disposição da fábrica, com dois objetivos: um era melhorar a qualidade de vida para nossos funcionários, que produzem mais de 6.000 carros por ano, e também para melhorar a qualidade do produto. E acabamos ganhando um prêmio como a melhor companhia para trabalhar na Europa, entre todas as melhores companhias europeias.
IHT: Aquela foi a época de Jean Todt como diretor da equipe mais bem sucedida da história, com o piloto Michael Schumacher e muitos grandes diretores que hoje não estão mais na Ferrari. Como está sendo essa transição?
Montezemolo: Em 1992, quando tentei entender por que não havíamos ganhado nada em 20 anos, o que eu fiz foi: eu disse que precisávamos de uma pessoa que pudesse ser número 1, sem ser um engenheiro. A mesma decisão que a Ferrari tomou comigo nos anos 70: eu não era um técnico, mas um organizador e administrador. Segundo, escolher três ou quatro pessoas com uma competência muito específica e conhecimento de aerodinâmica, eletrônica, etc. Terceiro, encontrar os melhores jovens e deixá-los crescer num programa de três ou quatro anos. Escolhi um que não era italiano, Jean Todt, e fui criticado. Eu disse a Todt: “Você tem seis meses para voltar aqui e me dizer quem são os melhores, e eu quero pelo menos três pessoas que venham de fora, trazendo experiência”. A ideia era para ser como no futebol: quando Maradona treina com outros jogadores, os jovens podem aprender bastante com ele. Então eu disse que se pudéssemos encontrar três ou quatro pessoas que eram as melhores em suas áreas, isso seria bom para os jovens. E foi crucial para hoje. Agora eu tenho uma equipe totalmente nova, mas 99% das pessoas de hoje eram número 2 ou 3 naquela época.
IHT: Qual é sua visão de longo termo para o programa do carro de rua?
Montezemolo: Muito positiva. No GT, lançamos esses novos carros chamados California. Então no GT nós temos uma visão muito clara em termos de produtos, tecnologia, mercados. Em meados dos anos 90, os EUA eram de longe o maior mercado para a Ferrari, junto com a Alemanha e a Itália. Isso respondia por 60%. Hoje, nós vendemos cerca de 300 carros na China, vendemos muitos no Oriente e no Oriente Médio. Os Estados Unidos continuam sendo nosso maior mercado, mas temos uma presença bem maior no resto do mundo. Abriremos na Índia dentro de alguns anos; este pode ser um bom mercado no futuro, mas decidimos não abrir ainda. Meu programa é manter a exclusividade, mas aumentar o volume por causa dos novos mercados. Aumentaremos o volume total graças à China, a Abu Dhabi, ao Brasil, à Índia. Em segundo, estamos aumentando drasticamente o que eu chamo de serviços, ou seja, as marcas, a internet –temos uma presença enorme na internet– e uma renda de 50 milhões de euros apenas usando a marca, com licenciamentos, merchandising, e-commerce e vendas, com 40 lojas em todo o mundo vendendo mercadorias. A mais bem-sucedida no momento fica em Macao.
IHT: E o futuro da Fórmula 1?
Montezemolo: O futuro da Fórmula 1 para nós significa três coisas: tecnologia avançada, sem ela não há motivo para correr; regras estáveis, ou então não mudar as regras a cada seis meses; e a possibilidade de manter a característica da Fórmula 1, em outras palavras, não ter o mesmo carro para todos, não ter o mesmo motor para todos. Os custos são cruciais, mas podemos fazer carros mais baratos enquanto mantemos ao extremo as características da Fórmula 1. E, além disso, os custos são muito importantes: você precisa cortar os custos. Mas você tem que aumentar o lucro. E acho que isso é muito importante. Para mim, a Fórmula 1 faz parte da vida da Ferrari, nós estamos nela desde 1950. Mas precisamos manter, e se for possível, aumentar o apelo e as características da Fórmula 1.
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