segunda-feira, outubro 29, 2012

A MORTE NOS QUADRINHOS


Fiquei sabendo outro dia que, nos Estados Unidos, no fim de uma grandiosa saga que mostrou o conflito entre os X-Men e os Vingadores (mais uma Guerra Civil, mas agora envolvendo os principais mutantes do Universo Marvel), o professor Charles Xavier acabou morrendo. Não faço ideia de como foi que ele bateu as caçoletas. O que sei mesmo é que o recurso da “Morte de Fulano de Tal” é largamente empregado pela indústria quadrinística quando se quer alavancar as vendas de determinada revista.
            Os exemplos são muitos e variados.
            Tempos atrás, um grupo de heróis adolescentes da DC Comics foi reunido em uma empreitada bem-sucedida: a Turma Titã. Era formada basicamente por Robin (Dick Grayson), Aqualad, Kid Flash, Moça-Maravilha e Ricardito. Com o passar dos anos, a DC resolveu dar um enfoque mais adulto para esses personagens, e no fim das contas eles precisaram crescer para formar “Os Novos Titãs”. Para esse processo de amadurecimento, Dick Grayson já não podia mais ser o Robin. Passou a ser chamado de Asa Noturna. Logo, o Batman precisou encontrar um novo parceiro mirim que o ajudasse a combater o crime na sombria e perigosa Gotham City.
            Acabou encontrando Jason Todd. Um órfão (requisito comum entre aqueles que participam das peripécias do Homem-Morcego) que tentava roubar os pneus do Batmóvel. O guri naturalmente foi aceito. Vestiu naturalmente o manto de Robin. Fez naturalmente algum sucesso lá fora – aqui nem tanto -, até que os figurões da DC, talvez sentindo que as vendas das revistas do Batman não estavam mais indo de vento em popa, resolveram que o garoto fosse brutalmente morto pelo Coringa. Pelo que li a respeito, chegou-se a montar uma espécie de debate entre os leitores de quadrinhos norte-americanos. Afinal, eles acabaram decidindo pela morte de Jason. A estratégia deu certo. O arco de histórias no qual a morte é narrada arrebentou a boca do balão, nos States e aqui. Lembro que DC Especial em que o assassinato aconteceu vendeu feito pitomba de feira.
            E qual nerd não se lembra da morte do Super-Homem (“Superman” é imposição ridícula)? Essa jogada de marketing também funcionou de forma estupenda. Rendeu muita grana para a Editora Abril. Apesar dos muitos crimes editoriais que ela cometeu ao longo dos anos (basta pesquisar o que fez, por exemplo, com “Guerras Secretas”), a gente precisa dar a mão à palmatória. Foi um ótimo trabalho de tradução, adaptação e encadernação – concluído com a publicação das versões nacional e estadunidense da batalha em que Kal-El defendia até a morte sua amada Metrópolis da devastação promovida pelo monstro Apocalypse.
            A Marvel não fica atrás. Mas esta se destaca mais pelo outro lado da medalha: as ressurreições. Para ela, fazer um personagem voltar à vida parece render mais do que matá-lo. Foi o caso do Capitão América, cujo assassinato marcou o fim da Guerra Civil. O mais engraçado é que, numa determinada história do Thor, o Filho de Odin chega a conversar com o fantasma de Rogers. E daí? Esqueçamos esse lapso. Na verdade, Steve acabou se tornando um prisioneiro do tempo. Após o seu resgate, ele se tornou o comandante da Shield com a queda de Nick Fury e, em seguida, de Norman Osborn. E tem funcionado bem nesse papel, desde então.
            Os mutantes também tem sua cota de “mortos que voltam para perturbar”. Vejam só o caso de Jean Grey. Ela aparentemente morreu quando salvou os X-Men de virarem churrasquinho na reentrada da órbita da Terra (estou me expressando direito?). Ela acabou voltando tempos depois porque quem morreu mesmo foi um clone dela criado pela entidade Fênix – que também manteve a telepata-telecinética em um estado de animação suspensa no fundo do oceano, até ser providencialmente encontrada pelo Quarteto Fantástico. Ou foram os Vingadores? A memória anda uma droga.
            Como se vê, essa história de matar ou fazer voltar à vida personagens de destaque não passa de mero instrumento capaz de estimular e manter em rotatividade a indústria dos quadrinhos. Para quem acha que é só bobagem, trata-se de um mercado que movimenta milhões e milhões de dólares.
            Mas é preciso discernimento na hora de bater o martelo e determinar: “Tá na hora de Fulano de Tal bater as caçoletas”.
            Corre-se o risco da banalização.

NEY FARIAS CARDOSO
Revisor de O Estado

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